Chuva de Bala no País de Mossoró, uma crítica
Foi boa a iniciativa da Prefeitura de Mossoró de manter o evento Chuva de Bala de forma virtual. Esse espetáculo visto por milhares é esperado todos os anos pelos mossoroenses e por pessoas que entendem a importância histórica e cultural dessa atividade artística. Em 2021, a apresentação foi transportada para as telas mesclando teatro e cinema e nos dando outras perspectivas dos atores e da direção, mas também aguçando novas ideias e possibilidades.
Os pontos positivos começam pelo já dito que é a manutenção do evento, respeitando e oportunizando a vários artistas, desde atores, músicos, dançarinos, diretores, cinegrafistas, roteiristas e tantos outros, o direito ao trabalho. Sabemos que nesta pandemia a arte foi muito prejudicada, pois sem público não há apresentações. Pudemos ver ainda várias performances de atores conhecidos que ficaram melhores no vídeo do que no teatro, ao contrário de outros.
Imagino a dificuldade que foi de adaptar um texto teatro-musical para as telas sem praticamente haver modificação de roteiro, mais financiamento para cuidar melhor do cenário e de outros detalhes. No adro da Capela de São Vicente a utilização de armas artesanais não faz muita diferença, já no detalhe da câmera, isso não ficou bem. Ainda assim, é notório o esforço dos participantes em tornar o roteiro possível, ainda que com suas características lúdicas, esse jeito meio mambembe para tornar a coisa mais leve e acessível a todos.
Quero pontuar aqui e reconhecer o talento do diretor Marcos Leonardo que sempre foi muito corajoso e agora mais do que nunca. Destaco também a beleza da atuação de Igor Fortunato, o Totonho, personagem que vai dando a linha narrativa e contextual do acontecido. Alguns nomes desconhecidos por mim também surpreenderam em suas atuações. Como sempre, a cena das viúvas foi a melhor parte, a que mais tocou e movimentou emoções nesta apresentação híbrida. Mas digo isso porque tenho clara preferência por este momento, de maneira que acho até caberia, depois, um espetáculo específico com pegada semelhante.
Aponto como críticas menos positivas o fato de o roteiro não ter sido reescrito e adaptado exclusivamente para o cinema. Confesso que esperava um filme com frames específicos, atuações mais de cinema e menos de teatro, sequências melhor elaboradas e algumas atuações que poderiam ter sido refeitas. Novamente, coloco como pontos negativos as locações e objetos do cenário, como o carro dirigido pelo chofer Gatinho, o qual levava o Coronel Gurgel, que foi o mesmo cenográfico usado no espetáculo de rua. Em minha visão de espectador leigo, acho ainda que o teatro mossoroense precisa se reciclar para que alguns atores sejam menos teatro de rua e tragam mais verdade na atuação.
Critico também a ausência das músicas oficiais que, certamente, não foram novamente liberadas pelos autores, o que considero um enorme desserviço.
Tudo isso me faz imaginar que a Prefeitura, os diretores, atores e outros setores, poderiam sim pensar, de fato, na produção de um filme para cinema dessa história. Mossoró e o estado do Rio Grande do Norte têm condições, atores, diretores e roteiristas para produzir algo a nível do grande cinema brasileiro. O cinema potiguar, que neste ano está concorrendo à Palma de Ouro no Festival de Cannes, merece um filme sobre o acontecimento histórico mais relevante do interior potiguar, sobretudo por suscitar amor por nossa terra, respeito e sensação de pertencimento.
Mossoró sozinha tem condições técnicas e humanas para fazer isso. Espero que o filme desse ano seja o motivador para esse grande feito futuro.
Imagem: Cedida/Prefeitura de Mossoró