O primeiro fotógrafo negro do RN e um dos pioneiros na fotografia potiguar
Um homem à frente do seu tempo! Zé Ezelino, ou José Ezelino da Costa, foi mais do que um fotógrafo; foi um visionário que deixou um legado inestimável para a arte e a cultura caicoense e potiguar. Filho de escravos e nascido em Caicó no ano de 1889 – um ano após a abolição da escravatura no Brasil, a Lei Aúrea, assinada pela então Princesa Isabel. Ezelino nasceu no sítio Umbuzeiro, sertão do Rio Grande do Norte, nos arredores da cidade de Caicó, sociedade predominantemente branca, e foi lá onde ficou famoso como fotógrafo “freelancer”, o primeiro fotógrafo negro do sertão de Caicó e um dos pioneiros da fotografia potiguar.
Ele morou a vida inteira com a mãe, Dona Bertuleza Maria da Conceição uma ex-escrava. Ele também nunca casou oficialmente, porém, teve dois filhos de uma namorada. Sua primeira câmera foi um presente de um vizinho, que, voltando de uma viagem a Recife, trouxe a câmera e um álbum de fotografia. A partir de então aprendeu a fotografar sozinho e nunca mais largou a arte da fotografia. Zé Ezelino também expressou sua genialidade na música e na pintura, vencendo eventuais preconceitos de raça e de condição financeira. Filho da escrava alforriada e de pai desconhecido, “Zézelino” foi músico, pintor, agricultor e fotógrafo.
Como músico, tocava vários instrumentos, integrava a Banda de Música e era compositor convivendo com nomes consagrados como Felinto Lúcio Dantas, em Carnaúba dos Dantas, e Capiba, em Recife/PE. Como pintor, produzia cenários para emoldurar fotografias e outras mais peças que faziam parte de seu estúdio de fotografia. segundo apontamentos de Ana Zélia, sobrinha-neta de José Ezelino, os principais registros de Caicó de seu tempo foram feitos por ele: “imagens em Caicó da enchente de 1924, no ano seguinte a visita do presidente eleito Washington Luiz, a chegada de Roma do Padre Walfredo Gurgel, a construção do Açude Itans”, relatou Ana Zélia.
Pouco se sabe de sua história e como descobriu a fotografia, só se sabe que ele adquiriu experiência com profissionais da Paraíba e do Pernambuco, através de um recorte de jornal da época. Mas, ele conseguiu registrar uma das 10 maiores cidades do Rio Grande do Norte, principalmente que esteve em ascensão economicamente, com a agricultura do algodão. Era uma profissão na época rara no Sertão, na década de 20, principalmente nos recantos distantes dos grandes centros urbanos do país.
Ele chamou atenção pelo modo como fotografava sua família
Naquele período, Ezelino registrou em sua máquina a si mesmo e a seus familiares com a mesma linha estética das famílias de alta classe da Região Sudeste e de países europeus. O artista, um grande inovador, criou figurinos direção, cenários e captação de imagens utilizando seus próprios recursos e sem apelar para referências de outros artistas.
Um dos fatores que chama atenção no trabalho do fotógrafo foi o modo como ele retratou os membros da família, quando não era comum encontrar imagens de negros que não estivessem em trabalhos subalternos, no campo, ou nas grandes capitais, em fábricas ou indústrias. Ezelino levou familiares para dentro do estúdio e os fotografou com roupas sociais na moda da época, com o pioneirismo de experimentar a estética aristocrática na pele negra.
A pesquisadora Ângela Almeida lançou o livro “Quando a pele incendeia a memória”, em 2018, resgatando o trabalho do fotógrafo caicoense. Além disso, Ezelino imortalizou imagens de parentes e amigos e o cotidiano da sociedade da sua época. Para a elaboração do livro, Ângela Almeida contou com o apoio da sobrinha-neta do retratista, a arquiteta Ana Zélia Moreira, que apresentou o álbum de família, herança deixada por sua mãe. O livro conta com projeto gráfico de Rafael Sordi Campos e ilustrações de Michelle Holanda.
Não existe nenhum registro fotográfico semelhante ao de José Ezelino no Brasil. A maioria dos registros é da população negra retratada como vendedores de ruas ou como trabalhadores de baixo escalão. Segundo a pesquisadora, Ezelino produziu um vasto material da cidade de Caicó e demais regiões do Seridó. Infelizmente, muitas destas fotos foram perdidas ao longo dos anos, o que fortalece ainda mais a importância do trabalho da pesquisadora Ângela Almeida. Recentemente, o livro foi eleito por um grupo de especialistas em fotografia como um dos melhores fotolivros de 2018.
Publicado em 2018, o livro “Quando a pele incendeia a memória” da pesquisadora potiguar Ângela Almeida se divide entre o histórico do fotógrafo e um trabalho autoral, feito a partir das imagens resgatadas do biografado. “Realizei uma interferência, que é quando o artista se apropria de uma obra que não é dele e intervém sobre aquela imagem”, explicou a pesquisadora, que é jornalista.
Exposição Fotográfica e o filme sobre Zé Ezelino
Os primeiros retratos de pessoas negras do Rio Grande do Norte fotografadas por José Ezelino da Costa no início do século 20 serão apresentadas ao público, pela primeira vez, na exposição “Quando a pele incendeia a memória – Nasce um fotógrafo no sertão do século 19”. Paralelamente ao lançamento do livro que dá nome à mostra da professora e pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Ângela Almeida. A exposição foi aberta na Casa de Cultura Popular de Caicó, Sobrado Padre Guerra, com acesso gratuito.
A exposição, que tem curadoria de Ângela Almeida e expografia de Rafael Campos e Michelle Holanda, contará com 40 fotografias. Os retratos revelam a identidade social da cultura negra e o dia a dia da região do Seridó, cuja sociedade da época era predominantemente branca, comandada por uma elite de coronéis e fazendeiros. A pesquisadora contou com o apoio da sobrinha-neta do retratista, a arquiteta Ana Zélia Moreira, que apresentou o álbum de família, herança deixada por sua mãe.
O documentário “Zé Ezelino” é uma produção da Agência Referência e conta a história do artista caicoense que se tornou o primeiro fotógrafo negro do Seridó. “Um homem à frente do seu tempo! Zé Ezelino, ou José Ezelino da Costa, foi mais do que um fotógrafo; foi um visionário que deixou um legado inestimável para a arte e a cultura. Para nós, da Agência de Referência, é uma alegria imensa trazer à vida mais um projeto em homenagem a esse grande artista caicoense”, destaca o diretor Raildon Lucena.
O filme tem Direção e Produção Executiva de Raildon Lucena e Diego Vale, Assistência de Direção de Ed Junior, Fotografia de Gabriel Morais, captação de som direto de Gabriel Rodrigues, montagem, desenho de som e trilha sonora por Julhin de Tia Lica, e Identidade Visual de Franck Fernandes. “Em 2021, reeditamos o álbum Caicó, Ontem e Hoje com o apoio da Lei Aldir Blanc, que trouxe fotografias da cena urbana de Caicó, registrada por José Ezelino. Agora, estamos produzindo um documentário sobre sua trajetória. É a segunda homenagem da Referência a esse artista”, observa Diego Vale.
Na programação do Seridó Cine, festival de audiovisual do Rio Grande do Norte, estreou o filme curta-metragem “O Photographo Zézelino”, desenvolvido pelos fotógrafos Damião Paz, Meysa Medeiros e Henrique José. Os idealizadores se inspiraram no livro “Quando a pele incendeia a memória”, da artista Ângela Almeida, que resgata um personagem importante e emblemático da fotografia potiguar, o fotógrafo caicoense José Ezelino da Costa, que no início do século XX, eternizou em suas imagens, a cidade e o povo do seridó.
O cenário visa uma viagem ao passado, constituindo-se de roupa característica de época, além de objetos cênicos, como câmeras fotográficas, rádio, entre outros instrumentos, que auxiliam na construção de um dia na vida de Zézelino. O ator responsável por dar vida ao personagem é o também fotógrafo Damião Paz. O filme de 3 minutos se torna um resgate e uma homenagem a Zézelino, nome tão importante nas páginas da história nordestina e do Brasil.







