Últimas histórias

  • Vaca Profana

    “De perto, ninguém é normal”. Pelo que tenho visto e conversado com amigos, Caetano nunca foi tão certeiro. Quase todo mundo que conheço toma algum ‘remedinho’. Seja para conseguir dormir, tratar depressão, controlar a ansiedade. E, não, não é só gente da minha meia inteira idade. É todo mundo mesmo. Crianças agitadas se tornam hiperativas e são medicadas. Adolescentes buscam seu lugar no mundo e viram melancólicos depressivos. Adultos não conseguem dormir por tantos motivos e têm que ser dopados. Ansiedade campeia, crises de pânico, tristeza.  Ah, deixa de ser exagerada! Exagerada? Eu? Tá, posso até forçar um pouco a barra ao generalizar, mas não tô exagerando naum. Basta um pouquinho de atenção ao redor ou escutar colegas de trabalho, parentes e amigos que você constata que a sociedade caetaneou. Mas, caetaneou errado, né? Quando Gal rasgou o vozeirão em Vaca Profana naquele longínquo 1984, eu era apenas uma adolescente alta com bustão. A identificação foi quase imediata. Se não divinas, minhas tetas não eram passíveis de ser ignoradas. Além disso, sempre respeitei mais minhas risadas e aquela coisa toda de colocar os cornos “pra fora e acima da manada”, derramar “o leite mau na cara dos caretas” e a “movida Madrileña”… Tudo aquilo me pegou de um jeito traduzir-se. Sempre tive horror em ser igual e ter só uma tribo. Fazer parte de vários grupos e rodas e turmas me permitiu ser várias e aprender com todos e me divertir e viver intensamente. Apesar de me considerar tímida em determinados aspectos e situações, noutras só puro acontecimento. Ou era. É, porque o meu não ser normal está sendo o normal desse mundo que caetaneou errado, que tem crises de ansiedade e precisa também de ‘remedinhos’ para dormir ou não enlouquecer. Respira. Respirar fundo e profundamente, expirar lentamente e tentar não se perder de mim. Respeito muito minhas lágrimas, mas continuo além disso e me buscar é exercício diário. “A vida não é só trabalhar”, já dizia Pepe Mujica, “há que se deixar um bom capítulo para a loucura que tenha cada um. Porque uma coisa que fazes por obrigação não é liberdade. Só és livre quando gastas o tempo de sua vida em coisas que te motivam, que gostes”.

  • Sem medo de ser feliz

    Adjetivo de dois gêneros, feliz significa “favorecido pela sorte” e aquele “cujos desejos, aspirações, exigências etc. foram atendidos ou realizados”. Seria legal que ser feliz fosse assim, fácil como ler no dicionário. Mas, não é. É preciso muito amor próprio e consciência das limitações.  É preciso coragem para aceitar o que a vida nos traz e o que fazemos com isso. Coragem para ver nossos anseios realizados. Saber que nossas escolhas impactam diretamente no dia-a-dia e em qualquer aspecto de nossas vidas. Ser feliz é compromisso com você mesmo e com o que nos rodeia. Todo mundo quer ter as necessidades atendidas, da mais básica – como comer e dormir – às da alma. Todo mundo quer ser feliz. Feliz nos relacionamentos. Feliz na vida familiar. Feliz no trabalho que temos. Feliz na profissão que escolhemos. Feliz com os amigos. Feliz na vida que conseguimos ter e com as opções que fazemos. Não se trata aqui, é claro, de viver rindo ou ser um bobo da corte, mas sim daquela sensação de que alcançamos o possível e nos contentamos com isso. Ninguém falou também em abandonar ou não ter sonhos, mas em estarmos dispostos a lutar por eles e sabermos que nem sempre é fácil. Dizem que a felicidade é construção, é jardinagem, é regar todos os dias e ver como floresce ou frutifica. É estado de espírito. É exercício diário. É correr riscos e batalhar pelas mudanças que queremos. É preciso coragem e todos os dias dar a cara à tapa e ao riso, sem medo nenhum de ser o que se é, de esperançar por dias melhores, sem medo de ser feliz.

  • Sábado à noite

    Ouço as conversas ao redor, meus olhos disparam por todo o ambiente, os pensamentos vagam enquanto rio das piadas e balanço o corpo no ritmo da música. As percepções se sucedem. A bela mulher que passa derramando olhares. O homem branco levemente constrangido com a informalidade local. A negra linda exibindo orgulhosa suas raízes afro. O músico que se anima tanto com a performance que espanta o cansaço e vibra energia. A atendente do balcão com o sorriso forçado congelado nos lábios a repetir insinceras delicadezas. O turista que fala alto na mesa ao lado para se fazer notar. O casal barbudo que aparenta estar em lua de mel. A não tão jovem senhorita que tenta sem jeito se sentir à vontade. Respondo animada ao cumprimento de uma amiga querida que o dia-a-dia afastou do convívio, escuto as novidades de filhos e netos, repetimos perguntas já feitas algum dia enquanto dançamos e fazemos selfies. Outras amigas se juntam, o alarido de vozes não esconde a alegria do momento nem da banda que interpreta boa parte da trilha sonora de nossa existência. Peço um espetinho à garçonete sempre tão gentil e que parece não esquecer as poucas vezes em que estivemos ali. Meus companheiros à mesa conversam e dançam e gravam vídeos como a imortalizar um momento prazeroso. A chuva forte não estraga a alegria da noite entre bares, caminhadas, bebidas estranhas e sonoras gargalhadas. A vida é boa. Celebremos.

  • Todas as Mulheres

    Todas as Mulheres

    Todas as mulheres do mundo pode até ser nome de filme e série, mas é algo muito sério quando a gente pensa que todas nós sofremos apenas por ser mulher.

    Todas as mulheres em mim estão cansadas, diz a poeta afro-americana Nayirrah Waheed. Estamos mesmo. Cansadas de violência, de abuso, do desrespeito, de cagarem regras por nós e para nós, de julgamentos, de opressão, de sentir medo, de assédio, de trabalho doméstico, de acharem que não somos capazes, da imensa carga mental que é ser mulher.

    Todas as mulheres do mundo vivem em mim e há dias em que é difícil demais levantar. Há outros em que é quase impossível dormir.

    Todos os dias.

    Todas as mulheres.

    Tudo em mim.

  • Esticando a Corda

    “Cu de burro, cu de burro na área…”. A expressão alçada à fama pelo saudoso narrador esportivo Zé Ary bem que podia ilustrar os relatos dessa pré-campanha para o Senado este ano no Rio Grande do Norte. Com apenas uma vaga em disputa, sete partidos já se prontificaram a ter candidatos para o chamado “céu” pelo então senador Agenor Maria.

    A eleição que, ao contrário do governo do estado, deve ser definida no 1º turno, com maioria simples, este ano ganhou uma nova sopa de letrinhas, já que alguns partidos mudaram de nome e alguns nomes mudaram de partidos. Mas, como parece que isso não importa mesmo, deixa pra lá.

    O partido Brasil 35 (ex-Partido da Mulher Brasileira) tem como pré-candidato ao Senado Federal o ex-deputado federal e advogado Ney Lopes de Souza. A Democracia Cristã pretende oficializar a candidatura da veterinária Shirlei Medeiros. O PSTU deve lançar a pré-candidatura do professor Dario Barbosa. Já o PSOL, que tinha três pré-candidatos, se definiu pelo nome de Freitas Júnior.

    O ex-ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho é o pré-candidato do PL. Carlos Eduardo vai tentar o caminho do céu pelo PDT e o atual deputado federal Rafael Motta, do PSB, quer que a vaga ocupada atualmente por Jean Paul Prates (PT) seja dele.

    Já o senador Jean sonha que seu partido resolva deixar de lado os forasteiros e se concentre em seu nome para a reeleição. Enquanto isso, se coloca à disposição para suplente do ungido pelo PT, aspira a uma futura secretaria estadual, quiçá um ministério e se nega a concorrer à Câmara Federal ou Assembleia Legislativa.

    Trabalhado exaustiva e escancaradamente há alguns anos sob patrocínio do governo federal, o bolsonarista Rogério Marinho vem reunindo prefeitos em torno de seu nome e urdiu também a pré-candidatura oposicionista de Fábio Dantas (solidariedade) ao Governo do RN.

    Apesar de ter reunido várias siglas em torno de sua pré-candidatura, Marinho deixa claro a quem queira saber “O palanque do presidente, no RN, sou eu, minha candidatura majoritária ao Senado e quem vai defender o legado do presidente Jair Bolsonaro sou eu, quem vai defender as realizações dele no RN, no Nordeste e no Brasil, sou eu”.  Alguma dúvida?

    O ex-prefeito de Natal e ex-candidato ao governo do estado, Carlos Eduardo (PDT) pode ter perdido as eleições em 2018, mas não perdeu a majestade… Ops, digo a oportunidade de se aliar à governadora Fátima Bezerra (PT) e ser seu candidato ao Senado como parece estar sacramentado até o momento.

    Numa bela jogada, a governadora Fátima vem atraindo seus principais adversários para a candidatura majoritária e esvaziando a oposição. Se vai conseguir seu intento, só outubro dirá.

    Quem também é aliado de Fátima e do governo petista, mas tem ‘atrapalhado’ um pouco o xadrez e “fincado pé” para ser o candidato governista ao Senado é o atual deputado Federal Rafael Motta, do mais novo amigo de infância PSB.

    Jovem, articulado, bonito e carismático, Rafael atrai uma boa parcela dos petistas que não perdoa Carlos Eduardo ter apoiado Bolsonaro em 2018. Resta saber se as correntes petistas vão conseguir esquecer ou desculpar o voto do menino Motta pelo impeachment da então presidente Dilma Rousseff.

    Como, pelo visto, o que não falta são telhados de vidros e estilingues — as velhas baladeiras — a postos e a campanha ainda está só nos ensaios, apesar do jornalismo militante, do jornalismo desejoso e dos blogs a soldo, muita água ainda há de correr sob as muitas pontes deste Rio Grande do Norte.

    Pelo que mostra a pesquisa Item divulgada no último dia 23, as intenções de votos para Marinho, Carlos e Motta estão tecnicamente empatadas, entre 14,7% e 13,4%.

    No quesito rejeição, Rogério Marinho lidera com 16,8%, seguido de Carlos Eduardo com 14% e Rafael Mota com 7,5%.

    Mas, o que impressiona é o número de pessoas que declarou estar indeciso ou votar branco ou nulo: 55,2%.

    Enquanto os eleitores desse cansado elefante não se decidem a assumir a responsabilidade pelas mudanças que quer ver realizadas no estado e votar para isso, a gente fica por aqui, ouvindo aquela velha canção da Xuxa que pergunta “Quem vai ganhar? Eu quero ver!” e, como as nossas referências musicais não estão as melhores neste mês,  encerramos com um pouco de Elias Becky e sua filosofia de cantiga de roda:  “Tem que ser forte pra não escorregar (…) Pra lá e pra cá, pra lá e pra cá, pra lá e pra cá. Só vai vencer quem em pé ficar”.

  • Até quando esperar?

    Covid. Dengue. Zika. Chikugunya. Fome. Malária. Hepatite. Desrespeito. Desemprego. Falta de empatia. Abusos. Asfixia. Corrupção. Aumentos. Inflação. Sucateamento. Descaso. Desamor. Ameaças. Ataques. Tiros. Ciladas. Chacinas. Destruição. Perda de direitos. Invasão. Milícias. Estupros. Violência. Caos. Necropolítica. Aporofobia. Racismo. Homofobia. Misoginia. Feminicídios. Intolerância. Mentiras. Miséria. Abandono. Câmaras de gás. Genocídio. Fake News. Desencanto. Desesperança.

    Se ainda não mataram o Brasil, lamento informar que falta pouco.

    E, confesso, estou se não como o Brasil, doente de Brasil.

    Todos os dias ataques a instituições e mais e maiores rasgos numa constituição espancada, sangrada e espezinhada.

    Todos os dias um Jesus morto. Seja um Genivaldo, os que padre Júlio tenta alimentar ou os tantos que encontramos nas ruas e calçadas.

    Todos os dias um tapa na cara e uma porrada no estômago.

    Cada vez mais difícil respirar.

    A dor é tão intensa que ninguém reage. Ou será que é isso que todos querem mesmo? Zumbis?

    Estamos vivendo, fingindo ou apenas esperando algo que nem sei mais se vem.

    Era sabido e anunciado que esse desgoverno ia ser difícil, mas não se imaginava que muitos que pensávamos bons, instituições que achávamos que funcionavam, categorias que… Silêncio, omissão e conivência.

    Todos os dias um tapa na cara e uma porrada no estômago.

    Até quando esperar?

    Como tentar se manter são nesse descalabro?

    Como deixar de ser uma plebe rude e néscia?

    Ainda existe um gigante para acordar? Ou ele também já está morto e não ficamos sabendo?

  • Dudu Galvão protagoniza espetáculo teatral em São Paulo e se prepara para lançar seu primeiro EP

    Por Ana Cadengue

    Imagens: Joao Caldas

    Formado em Artes Cênicas pela UFRN e ex-integrante dos Clowns de Shakespeare – um dos mais importantes coletivos teatrais do país – o ator Dudu Galvão já tem quase 20 anos de carreira profissional, atuando em dezenas de espetáculos com passagem por importantes festivais nacionais e internacionais, temporadas em espaços culturais dentro e fora do país, além de trabalhar com mestres da cena brasileira contemporânea. Seus mais recentes trabalhos em teatro são “Morte e Vida Severina” que estreou neste mês de abril (2022), em São Paulo (Produção Morente Forte), como o protagonista Severino, e a obra “SINAPSE DARWIN” (Produção da Casa de Zoé, Titina Medeiros).

    Dudu Galvão também integrou a famosa montagem de “Sua Incelença, Ricardo III (Clowns), com direção de Gabriel Villela, premiada internacionalmente. Possui formação em dança (clássico e moderno) e acrobacia de solo, bem como é experiente como cantor profissional há dez anos, numa jazz band. No cinema potiguar, protagonizou “Janaína Colorida Feito Céu” e “Sailor”, ao lado de Pedro Fasanaro, curtas premiados mundialmente, além do inédito “A Caixa de Lázaro”, produção local que estreia ainda esse ano, onde também interpreta o personagem protagonista da trama.

    Na música, com cerca de 10 anos de carreira, Dudu está prestes a lançar seu primeiro álbum autoral, intitulado “Minha Casa, Meu Jazz”, um EP com seis faixas inéditas, com produção e direção musical de Eduardo Taufic.

    A gente bateu um papo com Dudu sobre sua carreira e esse momento importante em sua vida.

    CLOWS

    “Acho que posso começar falando sobre essa minha transição, né de sair de um grupo de teatro, dos Clowns… Foi no momento ainda de pandemia que tomamos essa decisão juntos, a partir de percepções de interesses diferentes em que o grupo estava seguindo e eu também. E foi de uma forma tranquila, digamos assim, porque uma partida é sempre difícil, mas foi muito no sentido de buscar outras possibilidades criativas, né? Foi realmente um desejo interno, algo que foi sendo maturado, não tinha outro projeto. Mesmo assim, eu dedico toda a minha toda a minha formação a esse grupo com quem trabalhei durante 15 anos, a essas pessoas que fizeram parte dessa história e eu tenho só gratidão por estar me sentindo privilegiado de hoje poder colher bons frutos.

    TRANSIÇÃO

    Eu sempre me envolvi, acho que talvez de uns cinco, seis anos para cá que eu acabo sendo um pouco mais aberto para me envolver como diretor de movimento e assistente de direção de outros espetáculos em Natal. Além do meu trabalho com música, eu também estava já muito desejoso de me aprofundar e trabalhar com outros grupos, com outros artistas.  Isso me enriquecia muito e eu levava de volta para os Clowns. Um desses projetos que destaco foi o Meu Seridó, né? Que foi minha primeira grande direção de movimento. Me agreguei junto a Titina Medeiros e César Ferrário, um espetáculo belíssimo, que inclusive vai estar aqui em São Paulo em julho.  Depois, eu repeti a dose no Sinapse Darwin, só que no meio do processo pintou a chance de entrar em cena. Já tinha saído do Clowns e foi uma realização maravilhosa um espetáculo que tem aí uma vida grande pela frente e que eu também vou estar junto.

    MÚSICA

    É outro projeto que está finalizando, está agora no processo burocrático, é o lançamento do meu primeiro álbum autoral. Já tem praticamente 4 anos que eu gravei a primeira faixa. E aí dei um gás também na pandemia. Depois da saída do grupo, isso também me facilitou muito ter tempo para dedicar as composições e a entrar em estúdio. Fiz uma parceria linda com Dudu Tawfic e o CD está lindo. É um EP na verdade, com seis canções. Já está pronto para ser lançado. Eu estou fazendo a parte de inscrição nas plataformas e de registro também, já que eu preciso me inscrever como compositor para que eu possa ter segurança na distribuição. Eu estou muito feliz, só deixando essa poeira baixar aqui do Morte e Vida Severina pra começar também a cair de cabeça nesse lançamento que deve acontecer até o final do semestre. Ficou um trabalho primoroso, a minha cara… muito jazz e muita brasilidade, nordestibilidade, misturando aí essas linguagens que eu gosto muito. É uma música muito visual, o Dudu Tawfic conseguiu fazer um arranjo cinematográfico para as músicas e eu estou muito ansioso para lançar isso para a galera.

    MORTE E VIDA

    Essa realização profissional como protagonista de uma grande produção aqui em São Paulo, né? O Morte e Vida Severina tem uma história icônica de premiação internacional e a gente estreou no mesmo palco 56 anos depois e eu ter sido agraciado, escolhido entre centenas de candidatos para viver o personagem principal é um sentimento de… sei lá de… eu posso dizer de abertura de um novo ciclo na minha carreira e também o resultado de muito trabalho. São quase 20 anos que eu sigo assim trabalhando, não para chegar nesse lugar, mas de emprestar o meu corpo, minha voz e minha alma para esse ofício. Então, eu estou absolutamente realizado. A produção é maravilhosa. A gente estreou no último dia 16 e segue em temporada por dois meses e meio até o final de junho no Tuca, numa cidade em que a cultura está voltando a se movimentar de forma mais intensa depois da pandemia flexibilizar um pouco. Sei que isso ainda não terminou, mas a gente consegue agora ter mais circulação de pessoas com a vacina, né? Está um movimento bonito das pessoas voltarem ao teatro, as apresentações lotadas, os nossos ingressos com uma procura muito grande. E é isso. Foi uma identificação imediata em fazer parte desse projeto porque é falar de Nordeste, é João Cabral de Melo Neto, é um grande clássico, né? A gente tem mais dois potiguares na equipe, o diretor musical Marco França e a atriz Badu Moraes, que já mora aqui há cinco anos e é de Parnamirim e está arrasando como todo o elenco maravilhoso, outros nordestinos migrantes.

    SEVERINO

    Não tinha como dizer não quando eu recebi a ligação dizendo que eu tinha sido escolhido para viver o Severino, né? É um personagem muito desafiador. Talvez o maior desafio da minha vida como ator. E com certeza, ele vai sendo moldado com essa temporada, mas já tá aí num lugar muito gostoso essa coisa do merecimento, de você enquanto artista conquistar coisas que te fazem continuar trabalhando. Então, está sendo um momento muito bonito e quero te agradecer também por estar tendo essa oportunidade de falar mais sobre isso.

    Morte e Vida Severina volta ao Teatro Tuca após 56 anos

    A mais popular obra de João Cabral de Melo Neto retornou neste mês de abril ao Teatro Tuca, local em que estreou, em 1965. A nova montagem recebe a direção de Elias Andreato e reúne, no palco, 13 jovens talentos de várias cidades do Brasil, principalmente do Nordeste, e cinco músicos, que darão tom às composições de Chico Buarque, sob a direção musical de Marco França.

    A produção do espetáculo é da Morente Forte Produções Teatrais e envolve uma

    equipe renomada de criativos. O cenário tem a assinatura do artista que nos deixou recentemente, Elifas Andreato; os figurinos, de Fábio Namatame; desenhos de luz de Elias Andreato e Júnior Docini; desenho de som, de Marcelo Claret; e direção de movimento, Roberto Alencar.

    A ideia de produzir Morte e Vida Severina partiu de um sonho da dramaturga e

    produtora Célia Forte que, aos 16 anos, assistiu a peça no extinto Teatro Markanti. E a realidade se fez. “Trazer à baila, nesse momento, a poesia de João Cabral de Melo Neto e as composições de Chico Buarque, num Brasil com tantos ´brasis´, é tão necessário e forte, tão necessário e poético, tão necessário e seco e tão necessário e vivo”, acredita.

    Se esse espetáculo marcou a vida da dramaturga e produtora, a ponto dela ter certeza, ainda na adolescência, que “queria fazer isso da vida”, o diretor do espetáculo, Elias Andreato, tem uma forte relação com o autor. “Fiz minha estreia no teatro amador com a peça O Rio, de autoria de João Cabral de Melo Neto. Essa montagem de Morte e Vida Severina reúne um elenco de jovens talentosos e uma equipe de ´fazedores de arte´ comprometida em criar um espetáculo emocionante em sua essência”, conta Andreato.

    A obra Morte e Vida Severina é um auto de natal pernambucano, publicado em 1954/55, e que teve sua estreia nos palcos na inauguração do Tuca, em 1965. Na época, Roberto Freire era o diretor do teatro e partiu dele o convite para Chico Buarque musicar a obra de João Cabral de Melo Neto, o que acabou se transformando em um sucesso que atravessou fronteiras.

    A peça faz um relato sobre a vida e trajetória árida do povo do sertão nordestino, ainda desconhecidas pela maioria. O sofrimento enfrentado por Severino, na montagem representado por Dudu Galvão, ator natural do Rio Grande do Norte, é um retrato – ainda atual – dos migrantes nordestinos que buscam uma existência mais digna nas grandes cidades.

    Em sua viagem rumo a uma vida melhor, Severino se depara com situações de morte, desespero, de miséria e fome. Ao chegar à capital pernambucana se desilude, pois a realidade que encontra ali não é muito diferente da do sertão. Pensa em suicídio, mas o nascimento de uma criança faz renascer sua esperança, apesar das dificuldades. Assim, a saga nordestina se desenha, revelando a alma de um povo que caminha forte em sua fé.

    Para Dudu, “é um sonho de muito tempo, acontecendo no momento certo. Estrear em São Paulo, voltar a pisar no teatro com essa obra magnífica, sendo meu primeiro protagonista, depois de quase vinte anos de carreira, um nordestino no centro do palco! É muita emoção. Quando recebi a notícia, me senti

    muito honrado em poder dar voz a esse personagem tão icônico e desafiador. Arrumei as malas e saí de Natal com muita alegria no peito”, vibra o potiguar, escolhido entre centenas de artistas que mandaram seu material para as audições no começo deste ano.

    Nesse poema, João Cabral de Melo Neto abusa da linguagem poética sem deixar de lado aspectos sociais e políticos. O texto marca, inclusive, o momento em que a arte é usada para manifestações políticas no país. Os versos são curtos, sonoros (geralmente com sete sílabas) e quase musicais, lembrando as poesias de cordel. A sonoridade, portanto, é um elemento importante da obra. “Imagine um restaurador diante da Monalisa. Me sinto assim mexendo com essa obra de João Cabral e Chico Buarque. Pôr as mãos no sagrado requer muito cuidado, respeito e escuta. Preciso deixar os poetas ecoarem livremente sem que eu os atrapalhe. Deságuo a cada dia e agradeço por esse privilégio”, afirma o diretor musical, Marco França.

    Para a produtora Selma Morente, a temática do texto é urgente e necessária. “Revisitar essa obra em um momento tão difícil e desafiador é dar voz aos tantos Severinos espalhados pelo país, que não fogem só da seca, mas do preconceito, da fome, da exclusão, da marginalização”, acredita Morente.

    O diretor Elias Andreato concorda: “Nesse país tão plural, doloroso e esperançoso, somos todos Severinos em busca de poesia e dignidade”.

    A nova montagem de Morte e Vida Severina emprega, direta e indiretamente, cerca de 150 profissionais e fica em cartaz até o dia 26 de junho no TUCA, em São Paulo.

    Ficha Técnica

    Da obra de JOÃO CABRAL DE MELO NETO

    Músicas de CHICO BUARQUE

    Direção Geral ELIAS ANDREATO

    Direção Musical, Arranjos, Aboios e Lamentos (original) MARCO FRANÇA

    Voz MARIA BETÂNIA

    Poema Seca de DJAVAN

    ELENCO

    DUDU GALVÃO – Severino

    ANDRÉA BASSITT – Cigana 2

    BADU MORAIS – Mulher da Janela

    BEATRIZ AMADO – Retirante e flauta

    FERNANDO RUBRO – Retirante

    GABRIELLA BRITTO – Retirante

    IVAN VELLAME – Retirante

    JANA FIGARELLA – Funeral

    JOÃO PEDRO ATTUY – Coveiro 1

    JONATHAN FARIA – Mestre Carpina

    PABLO ÁSCOLI – Retirante

    PATRICIA GASPPAR – Cigana 1

    RAPHAEL MOTA – Coveiro 2

    MÚSICOS

    BEATRIZ FRANÇA – Contrabaixo acústico e baixo elétrico

    BRUNO MENEGATTI – Rabeca e violão

    DICINHO AREIAS – Sanfona

    RAPHAEL COELHO – Percussão

    RICARDO DUTRA – Viola e violão

    Cenário ELIFAS ANDREATO

    Figurino FABIO NAMATAME

    Desenho de Luz ELIAS ANDREATO e JÚNIOR DOCINI

    Desenho de Som MARCELO CLARET

    Direção de Movimento ROBERTO ALENCAR

    Assistente de Direção Geral JÚNIOR DOCINI

    Assistente Direção Musical, Preparação Vocal, Pianista Ensaiador MARCELO FARIAS

    Assistente de Cenário LAURA ANDREATO

    Cenotécnico – FABIN CENOGRAFIA e EDÉSIO BISPO

    Assistente de figurino – ANDRÉ VON SCHIMONSKY

    Modelista – JULIANO LOPES

    Costura – FERNANDO REINERT e MARIA JOSÉ DE CASTRO

    Operador de Som THIAGO H. SCHAFFER

    Microfonista GABRIEL VILAS

    Operador de Luz JUNIOR DOCINI e RAFA INÁCIO

    Contrarregragem/Camareiros FÁBIO OLLYVER e TONINHO PITA

    Coordenação de Comunicação BETH GALLO

    Assessoria de Imprensa – MORENTE FORTE – THAIS PERES

    Programação Visual LAERTE KÉSSIMOS

    Fotografia JOÃO CALDAS F°

    Assistente de fotografia: ANDRÉIA MACHADO

    Filmagem JADY FORTE

    Redes Sociais e Textos ANA PAULA BARBULHO

    Coordenação Administrativa DANI ANGELOTTI

    Assistência Administrativa ALCENÍ BRAZ

    Assistente de Produção NANA GENOVEZZI

    Administradora da temporada MAGALI MORENTE LOPES

    Produção Executiva MARTHA LOZANO

    Produtoras SELMA MORENTE e CÉLIA FORTE

    Serviço

    Morte e Vida Severina

    TUCA (670 lugares)

    Rua Monte Alegre 1024, Perdizes, São Paulo

    Sexta e sábado: 21h

    Domingo: 19h

    Ingressos:

    Sexta-feira – R$ 80

    Sábado e domingo – R$ 100

    VENDAS: https://bileto.sympla.com.br/event/71954/d/129792/s/809556

    Ou nas bilheterias do TUCA.

    TEMPORADA ATÉ 26 DE JUNHO

    Todas as últimas sextas-feiras haverá sessão em Libras.

  • Invernada

    De Natal a Baraúna, passando por Mossoró, São Rafael, Assú e mais um bocado de cidades no meio do caminho, muita chuva e uma vegetação verdejante. Os garrotes tudo gordinho, como diria meu sogro, agricultor calejado e aposentado há um bom par de anos. Nuvens de todos os tamanhos, calibres e cores. Formas também, já que eu passo boa parte da viagem olhando pro céu. O sol se insinua em alguns momentos e se deixa adivinhar pela mudança na paleta celeste. Carneirinhos se transformam em coelhos que viram porcos, jacarés e unicórnios antes que mudem para verdadeiros temporais. O som dos trovões se sobrepõe ao rock que sai do celular. Eparrê! Saúdo mentalmente pedindo proteção à Iansã enquanto cruzamos o estado e os desafios. Nas paradas para refeições e uso do banheiro, alguns alongamentos tentam minimizar as dores que com certeza virão. Reuniões de trabalho se sucedem aos encontros com amigos. Ou seria o contrário? Bom conhecer pessoas novas, melhor ainda é rever quem gostamos, tomar cerveja, rir desbragadamente, cantar a plenos pulmões, se entregar a abraços. As conversas se atropelam e os assuntos ficam inconclusos como se a aguardar o próximo encontro. Poucas horas de sono, mais estrada e a vontade de chegar num novo lugar. Gosto de correr campo, falar com gente, conhecer histórias. Um sentimento de esperança é percebido junto com a certeza de um bom inverno pro sertanejo. Tempo bom de plantar pra colher na primavera. Pelas minhas andanças, o que mais se planta é o desejo de um amanhã melhor. E eu sinceramente espero que a água das chuvas lave as ruas, almas e mágoas e desemboque num futuro que já vivi. E ainda me lembro.

  • Allah-lá-ô, ô ô ô ô ô ô…

    A voz de Jorge Ben – sou dessa época – ressoa na minha cabeça me lembrando que em fevereiro tem carnaval. Se for sincera, diria que ecoa em todo meu corpo. É, exatamente o que você imaginou, a minha carne é de carnaval.

    E, se os tempos não deixam que, assim como Moraes Moreira, “eu viro toca, eu viro moita”, me conformo em virar a foliã do bloco do “ensaia, mas não sai” ou do “eu sozinha” mesmo. As sombrinhas de frevo se juntam às máscaras de papelão colorido e aos colares havaianos enfeitando as paredes do terraço e trazendo um alento à minha alma foliã.

    “Sonhei que estava em Pernambuco/Fiquei maluco/Quando o frevo passou/Mas, quando estava no melhor da festa/Ora, esta alguém me despertou…”. Sei que é clichê, mas nada define melhor minhas últimas aventuras no reino de Morfeu do que o frevo de Antônio Nóbrega.

    Penso em Carnaval e as velhas marchinhas, sambas, frevos e maracatus invadem minha mente. A memória se atropela, subo e desço ladeiras, canto com blocos líricos, me impressiono e divirto com a criatividade das fantasias e adereços, pulso com a energia que vem do chão num mar de gente.

    Não vai ser neste ano que vou cantar “Voltei Recife”, mas a saudade que me pega pelo braço e pernas vai tentar se resignar com mais um ano de espera e de pequenas reuniões ao som das melodias que acalantam minha alma foliã. Porque Carnaval que se preze e se escreve com o C maiúsculo é festa popular e alegria de um povo.

    E já que hoje não tem clarins de Momo aclamando com todo ardor, fica a reverência dos que sabem bem ao que brindam quando gritam Evoé!  “E viva o Zé Pereira/Pois a ninguém faz mal/E viva a bebedeira/Nos dias de Carnaval”.

    Viva o Zé Pereira. E viva o Carnaval!

  • Nem Alice, nem maravilha

    Que princesas que nada, o personagem da literatura infantil com o qual sempre me identifiquei é o coelho, da Alice. Principalmente depois que cresci. “Ai, ai! Ai, ai! Vou chegar atrasado demais!”. A frase que desencadeia toda a maratona no país das maravilhas, me persegue há anos. Bom, pelo menos desde que assumi essa tal de vida adulta.

    Trabalho, casa, menino, marido, cachorro, jardim, papagaio… Falando assim pode até parecer exagero, mas se coloque no lugar de uma mãe/dona de casa/trabalhadora que você vai ver que eu não estou brincando. Fico até de boca aberta quando a mulher no caso tem mais de um filho.

    Gente, é quase insano dar conta de tanta coisa e ser boa nisso. Caprichar no almocinho, comprar as roupas da família – tá bom: lavá-las, passa-las e remendá-las também -, acompanhar as lições da escola, limpar e arrumar a casa, cuidar do jardim, ser uma profissional eficiente, uma companheira dedicada e mãe presente. Ah, e ainda tem que manter a boa estampa.

    Ok. Algumas têm ajuda de diaristas, mães, filhos e até companheiros. Outras de nós nem ligam tanto assim para tudo isso. Ainda há as que jamais saberão quem foi Amélia. Existem também as que se colocam naturalmente no papel. Confesso meu esforço e que não sou me saio lá essas maravilhas.

    “Estou atrasado! Estou atrasado!”. A voz do coelho ecoa no momento em que abro os olhos. E assim que consigo calar a vontade de virar pro lado e não fazer nada, começo a planejar o dia. Pelo menos rascunhá-lo. Nunca fui muito boa com planos mesmo. Me sinto meio Cebolinha…

    Mas, aí já é outra história.