A colunista do UOL, Milly Lacombe, escreveu nesta semana que “Neymar terá que lidar com o fato de defender um país que não gosta dele”. A escritora discorre brilhantemente sobre essa realidade, que muitos ainda insistem em não ver.
“Menino Ney está triste. Se sente injustiçado; não entende por que é tão detestado pelo país cujas cores defende com excelência.
O colega Raphinha foi às redes dizer que o Brasil não merece o Neymar, intensificando a sensação de menino Ney é um injustiçado e incompreendido.
Esqueçam em quem ele votou, pedem. As eleições acabaram, agora é Copa, completam.
A verdade é que o menino Ney não votou porque ele não transferiu seu título de eleitor, mas menino Ney declarou que votaria em Bolsonaro.
Ele tem direito de votar em quem quiser, berram muitos.
Verdade: teria mesmo.
Teria esse direito sagrado se um dos candidatos não fosse alguém de extrema-direita que diz amar a tortura, que tem como herói de vida um torturador que organizava o estupro de mulheres e arrastava os filhos pelas mãos para assistir ao estupro, que acena alegremente para o nazi-fascismo, que defende Hitler, que acha que negros podem ser medidos em arrobas, que mulheres merecem ser estupradas, que gays devem morrer.
Aos que ainda evocam os direitos democráticos de Menino Ney declarar voto em quem quiser eu diria que, nesse contexto, o único dever democrático seria o de se manifestar contra esse candidato.
Qualquer outra posição é apoio direto ou indireto ao nazi-fascismo bolsonarista.
Não é pouca coisa. É coisa demais, aliás.
Mas menino Ney calou sobre os horrores de seu amigo Bolsonaro e depois fez uma dança juvenil para declarar voto avisando que dedicaria um gol a ele na Copa.
Bem, esse gesto de amor a Bolsonaro não acontecerá na primeira fase. Menino Ney está fora por contusão.
Saiu de campo chorando. Pouco vibrou pela vitória. Está atento a si mesmo.
A Copa era para ser dele mas a marcação implacável e violenta o tirou de jogo e da primeira fase.
Neymar não é um menino, como tentam fazer parecer a todo o instante. É um homem de 30 anos.
Ele sabe perfeitamente que, jogando como joga, se não soltar a bola rapidamente vai ser marcado com intensidade. No jogo com a Sérvia ele segurou a bola e não deu passes que poderiam ter virado gol de seus colegas.
Optou por chamar para si a responsabilidade e quem viu o jogo com olhos atentos entendeu o que ele fez e o que ele deixou de fazer.
Aos que dizem que o posicionamento político dele está no passado e que agora é hora de Copa do Mundo eu diria o seguinte: posicionamento político nunca está no passado.
Posicionamento político é todo dia.
É o que a gente faz das nossas vidas, é como a gente trata outros, é as lutas que a gente escolhe lutar e as lutas que a gente escolhe ignorar.
É tentar driblar o fisco, ser multado e agir para negociar a multa mesmo sendo bilionário.
É fazer isso sabendo que os 88 milhões de reais da multa poderiam ser usados na construção de hospitais, escolas, estradas.
“Ah, mas no Brasil tem muita corrupção. O dinheiro não vai ser usado pra isso”.
Bem, se você não pagar impostos o dinheiro certamente não será usado.
Mas, se pagar, existe uma chance que é estatisticamente boa de ele ser usado sim.
E se parte dele for usada já é melhor do que nada.
(Para entender a treta com a receita: em 2015 Neymar foi autuado em R$ 188 milhões por não ter declarado seu imposto de renda no valor de R$ 63,6 milhões de 2011 a 2013. Sobre o valor inicial, houve multa e juros de 150%. Os advogados de Neymar recorreram da multa e conseguiram anular parte das sanções. Os 88 milhões é o valor dos 63,6 corrigidos).
Posicionamento político é colaborar com a investigação de uma acusação de violência sexual. Mas Neymar não fez isso quando foi acusado por uma funcionária da Nike e, ao não fazer, teve seu contrato interrompido pela empresa.
Posicionamento político é todo dia.
Veja a coluna completa em https://www.uol.com.br/esporte/colunas/milly-lacombe/2022/11/26/neymar-tera-que-lidar-com-o-fato-de-defender-um-pais-que-nao-gosta-dele.htm