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“DE PSICÓLOGO E LOUCO TODO MUNDO TEM UM POUCO”

A versão mais conhecida dessa expressão é: “De médico e louco todo mundo tem um pouco”. Nas minhas pesquisas me deparei com outras variações sobre o tema. Em um site de provérbios populares encontrei: “De poeta, médico e louco cada um tem um pouco”. Já o psiquiatra, professor e escritor de livros de psicologia aplicada, Augusto Cury, tem um livro intitulado “De gênio e louco todo mundo tem um pouco”. As duas derivações não fogem ao contexto original.

No Brasil, os criativos tradutores de títulos de filmes transformaram “The Dream Team” (O time dos sonhos) comédia americana de 1989 estrelada por Peter Boyle, Michael Keaton, Stephen Furst e Cristopher Lloyd em “De médico e louco todo mundo tem um pouco”. Faz muito mais sentido do que a tradução literal do título, já que o filme tem como pano de fundo um hospital psiquiátrico.

Esse provérbio português também está associado ao gênio e maior nome da literatura brasileira em todos os tempos, Machado de Assis, e ao seu magnífico conto O Alienista, uma sátira acerca da inviabilidade de se definir a esfera da loucura, sob o risco de incorrer em uma generalização.

Em O Alienista, Machado narra a história do Dr. Simão Bacamarte, um médico obcecado por detectar enfermidades psíquicas, que passa a recolher os supostos enfermos num asilo por ele criado – a chamada “Casa Verde” – com o intuito de tratá-los e ao mesmo tempo desenvolver suas teorias psico-científicas. A partir daí, Bacamarte interna em seu hospício todas as pessoas que agem de modo não racional – segundo seus próprios critérios – evidenciando os excessos da sua ciência. O resto é spoiler. Em tradução livre, estraga-prazeres. Recomendo o livro.

Em qualquer debate sobre a definição de normalidade ou anormalidade, são ou louco, torna-se necessário tentar definir os dois lados. É nesse ponto que nos deparamos com o paradoxo de Simão Bacamarte e suas teorias baseadas em critérios próprios e chegamos ao primordial questionamento em relação à loucura: de que lado nós estamos?

Senso Comum e Psicologia Científica

As pessoas no geral, têm um domínio superficial do conhecimento acumulado pela psicologia. E esse pequeno conhecimento lhes permite compreender o que acontece ao seu redor a partir de um ponto de vista psicológico, ainda que sem qualquer respaldo científico.

Quaisquer formas de persuasão, de irritação, de violência, de demonstração de prepotência fazem parte do imaginário da psicologia popular ou psicologia do senso comum. E se o cotidiano do senso comum – onde tudo parece previsível – nos apresenta a realidade nua e crua do dia a dia, a ciência procura compreender, elucidar e alterar esse cotidiano a partir de seu estudo sistemático. Nesse contexto, a ciência afasta-se da realidade para transformá-la em objeto de estudo, o que permite a construção do conhecimento humano.

Apesar desse distanciamento da realidade, algumas vezes os cientistas involuntariamente se submetem a certas prerrogativas do senso comum, do cotidiano. Exemplo: ao sair do seu laboratório de pesquisas e tentar atravessar uma rua movimentada, o cientista não vai se envolver com cálculos físicos e matemáticos para descobrir qual velocidade deve imprimir para conseguir atravessar essa rua sem ser atropelado. A intuição lhe indicará o momento presumivelmente perfeito para atravessar sem ser atropelado, embora o mais indicado seja obedecer à prudência e procurar um faixa de pedestres ou uma passarela.

O senso comum é capaz de absorver termos definidos pela psicologia científica que de certa maneira integram o conhecimento humano. Qualquer pessoa se sente capaz de reconhecer e identificar uma pessoa neurótica, histérica, complexada ou com o “psicológico alterado”, mesmo que o seu “diagnóstico” esteja completamente equivocado. Não é exagero afirmar, que a psicologia do senso comum “tenta explicar” tudo o que acontece ao nosso redor, nesse mundo conturbado em que vivemos.

E o “psicológico abalado ou alterado” explica tudo. No futebol, se um jogador está fazendo uma partida horrorosa, em que nada dá certo, não é raro ouvir um comentarista esportivo do alto dos seus profundos conhecimentos sobre psicologia, afirmar com toda convicção: “esse jogador está psicologicamente abalado” ou “alguma coisa alterou o psicológico desse jogador”.

E o torcedor, que não deixa de ser um “psicólogo de arquibancada ou de sofá”, compreende e assimila perfeitamente esse comentário psico-ludopédico. Afinal: “DE PSICÓLOGO E LOUCO TODO MUNDO TEM UM POUCO”.

               Essa conversa me fez lembrar de Téta, uma senhorinha que trabalhou na casa de minha irmã Stela até a aposentadoria por tempo de serviço. Quando a barulhenta “reca” de irmãos chegava para um tradicional almoço que acontecia sempre às sextas-feiras e ela estava meio “apoquentada do juízo” ia logo avisando: “vocês não venham me aperrear que hoje eu tô com o sistema muito nervoso”.

Filosofia e Psicologia

Na antiguidade (e tudo vem da antiguidade) os gregos já se preocupavam com a origem e com o significado da existência humana. As especulações em torno desse tema formaram um corpo de conhecimentos denominado filosofia. Alguns filósofos que seguiam uma linha mais “porra lôca”, passaram a perceber influências de alguns princípios científicos ou filosóficos, nas atitudes não muito convencionais dos seres humanos. Daí surgiu a psicologia. Simples assim.

E da mesma forma que temos a psicologia do senso comum com os seus psicólogos de plantão, temos também os filósofos do senso comum.

Como não pretendo me aprofundar em questões filosóficas, finalizo com alguns clássicos da Filosofia do senso comum ou de botequim. Um jeito etílico de aprender um pouco sobre filosofia.

  1. “Quem dá aos pobres e empresta, adeus”. Variante: “Quem dá aos pobres, tem que pagar o motel”.
  2. “A vida é para quem topa qualquer parada e não para quem para em qualquer topada”.
  3. “Por maior que seja o buraco em que você se encontra, pense que por enquanto ainda há terra em cima”.
  4. “Eu cavo, tu cavas, ele cava. Nós cavamos, vós cavais, eles cavam. Não é bonito, mas é profundo”.
  5. “A fé remove montanhas. Mas com dinamite é mais rápido”.
  6. “Na vida tudo é passageiro, exceto o cobrador e o motorista”.
  7. “Não deixe nada te desaminar, pois até um chute na bunda te empurra pra frente”.
  8. “Se um dia sentir um enorme vazio dentro de você, vá comer! Pode ser fome”.
  9. “Roubar as ideias de uma pessoa é plágio. De muitas, pesquisa”.
  10. “Para aqueles que bebem para esquecer: favor pagar a conta antes”.

“Estes são meus princípios. Se você não gosta deles, tenho outros!” (Groucho Marx)

Escrito por Marco Túlio

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