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Trocando de biquini sem parar

Nos últimos tempos vinha circulando nas redes e grupos de zap um meme divertido com uma vagem, o fruto verde de vários cultivos de feijão, cantando e a legenda “seu vagem”, fazendo alusão ao verso “selvagem”, repetido por Renato Russo na bela canção “Tempo perdido”, da Legião Urbana”. Trata-se de uma brincadeira, obviamente, mas que me remeteu a equívocos e mal entendidos em letras de músicas do vasto repertório brasileiro, da MPB ou rock.

Talvez o mais famoso deles é o verso que toda uma geração cantou como “trocando de biquini sem parar”, da canção “Noite do Prazer”, de Cláudio Zoli. Quantas vezes eu e amigos imaginamos porque razão a moça da música trocava de biquíni na tal noite. Por prazer? Tara? Vontade de ir à praia? Nada disso, anos depois descobrimos que o verso é “tocando B.B King sem parar,” referência ao gênio estadunidense do blues.

Há alguns anos escrevi crônica, publicada no meu livro “Minha mãe e o rato” (Editora Penalux, 2020) sobre essas músicas que são cantadas de forma errada, seja por nós, pobres mortais ouvintes, ou mesmo por artistas da noite em barzinhos. Como em uma oportunidade em que a cantora atacou “Como eu quero”, do Kid Abelha e de repente mandou um: “Jogos de guitarra não vão me conquistar”. Não sei o que seria isso, mas creio que seria mais fácil conquistar a bela Paula Toller com solos  e não jogos. Em uma outra vez, na inevitável hora da Legião Urbana, o cantor reformulou “Tempo perdido”: “Fomos são jovens”, bradou (e Renato Russo, iludido, coitado, escreveu a música no presente: Somos tão jovens).

Recordo de “Regra três”, de Toquinho, em que o autor disserta sobre os vacilos do protagonista da música e explica porque a amada vai embora: “Porque o perdão também cansa de perdoar”. Mas, certa vez o cantor do barzinho resolver subverter a letra e mandou: “Porque o perdão não se cansa de perdoar”.

Uma noite, desbravando bares em Parnamirim, eu e os amigos descobrimos  um cantor que era uma figuraça, de chapelão tipo Waldick Soriano, não com violão, mas com teclado com bateria eletrônica. Como o cidadão estava interpretando clássicos de Zé Ramalho, começamos a curtir. Contudo, na hora de Kriptônia, o artista atacou: “Não admiro que me fale assim” … Enquanto ainda refletíamos sobre isso ele continuou: “Sou primo gênio do seu avô, primeiro curandeiro…” O primeiro engano (trocar admito por admiro), até passaria, mas cantar primo gênio em vez de primogênito é dose até para os habitantes de Kriptônia.

Das lembranças mais antigas desses pequenos enganos musicais,  nos idos anos 90, em um barzinho na Ponta do Morcego, em Natal, uma amiga pediu o microfone para cantar e resolveu mandar “Mulher nova, bonita e carinhosa”, de Zé Ramalho, imortalizada por Amelinha, atraindo a atenção dos marmanjos. Até que, empolgada, cantou: “Quem não ama o sorriso feminino, desconhece a poesia dos Cervantes”. Ou seja, a querida transformou o escritor espanhol Miguel de Cervantes, criador do ilustre fidalgo Dom Quixote de La Mancha, em um povo, uma tribo, sabe-se lá, talvez em moradores de mais uma região espanhola, lá entre a Catalunha e Valência.

Não saber ao certo a letra da música acontece também em inglês. Reza a lenda que Bob Dylan ofereceu maconha aos Beatles quando estes aportaram em solo norte americano o porque ouviu em “I wanna hold your hand” o verso “I get high” (eu fico doidão) e deduziu que eram usuários contumazes da erva. No entanto a canção dizia “I can’t hide” (Não consigo esconder). E foi a primeira vez que Paul, John, George e Ringo fumaram cannabis. Por causa de alguém não entender a letra da música.

Escrito por Cefas Carvalho

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