Se aquelas palavras tivessem sido ditas de uma outra forma… Noutra ocasião… Também se fosse por um desconhecido, sei lá, não a tivesse chocado tanto.
— Você parece que anda no mundo da lua. Displicente. Irresponsável, é isso que você é. — bradou o gerente da loja, de uma maneira extremamente rude. Impróprio para aquela ocasião, assim pensava ela, coisas desse tipo acontecem.
Permanecia paralisada.
Enrubesceu. Os olhos queimavam. Não sabia ao certo o que queria fazer, se daria um sorriso e pediria desculpas, assim como sempre a sua mãe a ensinara, ou se devolver no mesmo tom de voz.
Estava no período mais movimentado, era um dos maiores supermercados, com várias filiais espalhadas na cidade. Gente de todos os lugares se deslocava para fazer compras nessa rede atacadista.
Antônia trabalhava como caixa há mais de um ano na loja 1, o que lhe rendeu, por sua dedicação, sem atrasos nem faltas, uma foto no mural como a melhor funcionária por três meses seguidos. Recentemente, ela também ganhou até um relógio muito bonito com a marca da empresa timbrada no mostrador, motivo pelo qual se orgulhava. Pois ela, que desde cedo colocou os pés no batente desse supermercado, vestiu a camisa e fazia tudo para que todos ficassem satisfeitos. O seu ego resplandecia por sempre ser lembrada dentre os mais de cem funcionários. Sinal que estava no caminho certo.
— Calma, minha filha, isso acontece, não se preocupe! Disse-lhe gentilmente a senhora com um belo sorriso, tentando amenizar a forma de abordagem do senhor Eduardo, que era o gerente.
Seu Edu, como era mais conhecido, era um dos mais antigos do mercado, usufruía de um posto bastante cômodo, haja vista que era de inteira confiança dos proprietários. Ora, outro dia uma companheira foi dispensada só por ter quebrado um potinho que continha azeitonas. Situação desconfortante para os outros funcionários. Aliás, para tratar sobre algum assunto com o seu Edu, era necessário ser bastante cuidado, como se pisasse em ovos. E todos já sabiam o porquê desse estresse todo.
Dias atrás ele “deu em cima” de Luana, moça bonitinha recém-contratada que o dispensou sem titubear. O castigo foi a imediata rescisão de contrato. Alegou-se “mau desempenho na função”. Graças a Deus, não passei por isso. Se bem que, em relação às outras mulheres, eu era, digamos, a que menos chamava a atenção. A minha baixa estatura me rendia apenas o nome de Baixinha, muito dificilmente não completavam a frase com uma “gostosa”. Mas que eu não me enganava, isso se tratava apenas de galanteios de alguns dos “meninos”, companheiros de trabalho, que queriam simplesmente fazer graça comigo.
Talvez por nunca conseguir sair com nenhuma delas, em represália, o Seu Edu se vingava tratando-as com hostilidade. Sempre. Uma pouca-vergonha para um senhor já com os seus sessenta e poucos anos, com filhos adultos e uma esposa que sempre vinha fazer compras na loja. Um amor de pessoa.
Ele agora a fitava, não entendia o que estava acontecendo, pois ela se mantinha imóvel. Envergonhada perante todos que presenciavam a cena. A fila no seu caixa para menores volumes, denominado de Caixa Rápido, crescia e já havia certa inquietação dos clientes. A senhora que educadamente recebeu o seu cartão de crédito de volta quebrado, talvez por um movimento um pouco mais brusco, mas sem maldade, pegava agora o talão de cheques, preenchendo o valor que seria creditado no cartão, se este não tivesse sido quebrado ao meio na hora de passá-lo na infame maquininha.
— Tudo bem, querida, não tem problema, tá? Disse-lhe novamente.
Sob o olhar de todos, lentamente levantou daquele pequeno espaço que ocupara por mais de um ano, pediu desculpas à gentil senhora, agradeceu e saiu.
O expediente e consequentemente o seu emprego findaram ali.
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