Sabe aqueles momentos que precisamos de singelas palavras? Foi exatamente assim, na minha busca por palavras sobre amor, e sobre espiritualidade, que me deparei com as palavras do escritor Flávio Siqueira, compartilhadas na Internet com muito carinho pela Caricaturista Ana Paula Medeiros: “Como desapegar das pessoas que amo? Você sugere que eu abandone pais, cônjuge, filhos… Isso é desapego?”. Amor é uma coisa, apego é outra. No primeiro caso, a base é a liberdade. No segundo, o sufocamento, o autoengano. Quem ama enxerga. Discerne a hora de ir, voltar, dizer, calar. Amar implica em ser sábio, paciente para maturação dos processos. É preciso ter calma para entender o tempo de cada coisa. É preciso ter calma e enxergar-se. Há situações difíceis envolvendo pessoas que se amam. Pais que sobrecarregam os filhos, cônjuges que não se respeitam mais, amigos que não se perdoaram, gente vinculada por alguma magoa, pesada como uma corrente presa aos pés, tropeçando, caindo, tentando levantar. Desapego é livrar-se da corrente, jamais das pessoas. Pode ser preciso afastar-se por um tempo para se recuperar, ter seu próprio espaço, mudar de ambiente. Talvez seja o contrário, hora de aproximar-se, diminuindo a distância que gerou o mal-entendido, quem sabe uma conversa franca e aberta seja suficiente? Não há fórmulas prontas. Apenas livre-se das correntes e saberá o que fazer. Isso é desapego. Você pode pensar que “se apegou” a alguém. Isso é impossível. O apego está ligado à sua insegurança, aos seus medos, vazios, que se projetam em alguém. Você não está preso à pessoa, mas em si mesmo. Podem ser pais, amigos, marido, esposa, filhos, até o cachorro. Conheço uma mulher com quase 40 anos que trata seu bicho de pelúcia como filho. O apego não está no bicho, mas nos vazios dela. O bicho só recebe essa carga. Ela não precisa se livrar do bichinho, mas encarar seus vazios. Desapego é abrir mão do excesso. É a coragem de enxergar-se nos maus entendidos, assumir sua responsabilidade nos desgastes, repensar até que ponto tem contribuído para que as coisas estejam fora de controle. É livrar-se da corrente e prosseguir com leveza, em amor. Amor gera autocrítica porque amor é consciência. É a gênese das desconstruções, do livrar-se da sobrecarga, do silêncio necessário para entender as causas, enxergar aonde tem errado, ter coragem para abrir mão do que precisa ficar para trás. Jamais abandone as pessoas, ainda que em alguns casos a distância seja necessária. Jamais se omita diante da necessidade de alguém, mesmo que existam situações aonde o silêncio é mais eloquente. Nunca mate outro ser humano dentro de você, mesmo que seja importante afastar-se. Desapego é enxergar-se no que te aflige, seja o que for, abrir mão do sentimento de vítima, entender aonde alimenta os processos e assumir que não precisa ser assim. É pacificar-se e prosseguir, amando as pessoas em liberdade, deixando as correntes pelo caminho.” E mais ainda sobre a nossa eterna busca… “Toda busca espiritual deve levar ao encontro com o próprio buscador. Buscamos sem saber direito a razão, como se um vazio nos movesse na tentativa de preenchê-lo, ainda que quase nunca saibamos o que está realmente faltando. Santo Agostinho dizia que esse vazio somente seria preenchido por Deus, que é o espaço onde ele cabe, só ele, e então transformaram Deus em um negócio extremamente lucrativo. O tal “espaço de Deus” virou outra coisa e o vazio ficou entulhado. Despejaram Deus de dentro e disseram que está fora, nos templos, nas religiões, nos livros, fora, sempre fora. Nos perdemos em nossa busca quando deixamos de olhar para dentro. Nos perdemos e o vazio ficou barulhento. Nos perdemos e o caminho ficou confuso, as palavras difusas, os sentimentos enganosos, nos perdemos. É preciso encontrar-se. Saber que o vazio é a falta de nós mesmos, sufocados por tantos condicionamentos, tantas crenças, tantos medos, tanta culpa, tanta coisa que disseram que deveríamos ser. Nos transformamos em sub produtos culturais, reagimos a estímulos, nos moldamos conforme o ambiente, o tempo, a sociedade, a cultura, os interesses, as crenças, até percebermos que estamos longe. Saudade de nós mesmos. Nenhuma busca espiritual será frutífera se não houver espaço para o reencontro. Desintoxicar-se do ego, reconectar-se com o próximo, vincular-se à vida, perceber-se em tudo. Encontrar-se é ser quem é. Esvaziar-se. É desentulhar o “espaço de Deus”, aceitando as desconstruções necessárias, se expondo a luz da consciência, até que tudo esteja limpo, vazio, desobstruído, espaço em silêncio. Não precisamos preencher vazios, precisamos retomá-los para que então nossa busca nos revele quem somos, nos preencha de Deus. Talvez Santo Agostinho tivesse razão”.
Vamos refletir!
Comentários
Carregando...