Quem vos escreve é uma pessoa que adora música, poesia, livros. Quem vos escreve é uma pessoa despida de qualquer tipo de preconceito. Quem vos escreve é uma pessoa que não está inserida em qualquer dos dois lados do radicalismo político que tomou conta de nosso país, contaminando até a opção de receber uma vacina contra uma doença que vem dizimando nossa população. Quem vos escreve é alguém que tem cinco livros publicados e continua produzindo. Quem vos escreve é um compositor que tem algumas canções gravadas e que recebeu um atestado de qualidade ao ter algumas delas incluídas na programação da FM Universitária de Natal, a 88.9. Quem vos escreve é alguém que se tornou fã de Gilberto Gil quando o ouviu pela primeira vez, nos idos de 1967. A canção era a antológica Procissão.
Gilberto Gil é, sem sombra de dúvida, um de nossos maiores compositores, conhecido mundialmente por seu trabalho prolífico, múltiplo, de qualidade. É um homem de mil sons e mil palavras e agora é um imortal, ocupando a cadeira de número 20 da Academia Brasileira de Letras, que tem como patrono Joaquim Manoel de Macedo, o autor do romance A Moreninha.
A eleição do ilustre compositor baiano tem gerado bastante polêmica, como tudo hoje no Brasil, com opiniões radicais e contaminadas pelo viés político e nos remete à discussão se letra de música pode ser considerada poesia. Afirmo que sim pois temos excelentes letristas como Chico Buarque, Caetano Veloso e Salgado Maranhão, que concorreu com Gil e foi derrotado e muitas das letras desses artistas poderiam figurar em livros sem causarem constrangimento. Salgado Maranhão, poeta e letrista, separa as duas coisas e tem alguns livros publicados com seus poemas. A questão maior se prende à disputa com Ricardo Daunt, cujo perfil de escritor e intelectual, crítico literário, ensaísta, fica muito além da obra de Gilberto Gil pois além de suas letras de canções se desconhece outro trabalho que possa ser classificado de literário. Justifica-se a candidatura de Gil e sua eleição pelo relevante valor cultural de sua obra, o que não deixa de ser verdade.
Fiz uma releitura do livro Gilberto Gil – todas as letras, organizado pelo também compositor Carlos Rennó, e encontrei verdadeiras preciosidades ao lado de outras que isoladamente poderiam parecer bobagens só merecendo serem lembradas por estarem acompanhadas de uma melodia, servindo para a dança e a diversão.
Gilberto Gil mereceria com certeza uma cadeira na Academia Brasileira de Letras de Música, mas esta academia não existe.
A admissão na Academia Brasileira de Letras, como em outras academias, ocorre através de uma eleição e de resultados de eleições já estamos cheios, apesar do sistema democrático ser inquestionável. Mas temos todo tipo de eleição, inclusive aquelas através das redes sociais, que não querem dizer nada. A eleição da atriz Fernanda Montenegro para a mesma academia vem sendo questionada e a explicação é a mesma dada para a do compositor baiano, um trabalho de relevante valor cultural. Fernanda Montenegro sequer teve com quem disputar, talvez porque pretensos candidatos já sabiam que se trata de um jogo de cartas marcadas.
Independente da questão, vou continuar admirando Gilberto Gil e ouvindo suas canções, considerando-o um imortal compositor e letrista.
Vou encerrar citando um trecho do livro do poeta Augusto de Campos BALANÇO DA BOSSA. “Quando termino a elaboração deste livro, sai o LP de Gilberto Gil (Phillips R 765.021 L). Na capa pop-brasil de Rogério Duarte + Antônio Dias + David D, Zingg, o compositor baiano desafia, sonsorrindo, de camisolão e machado-de-assis”. Gil debochava da academia da qual agora faz parte.