— Tudo pronto? Quer ir agora?
— Calma. Nem saí do banho!
— Mas você sabe que já estamos atrasados, né?
— Já disse que não saí do banho. Que encheção de saco, gente! Você não pode esperar minha saída?
— Custa dar uma resposta simples? Educação mandou lembrança. Grosseria em pessoa!
— Já sabia que eu era assim. Por que quis se enrolar comigo? Enganado é que não foi!
—Será mesmo que é preciso uma discussão sem pé nem cabeça por causa de uma pergunta? Não poderia dizer simplesmente a que horas iremos à bendita igreja? Carece dar patadas?
—Blá-blá-blá… Cheio de não me toques. Eu não disse nada demais. Apenas quero um pouco mais de tempo. Ora, que merda! E não me venha com nhenhenhém, pois você conheceu a mim e minha família muito bem antes de pegar a besta aqui!
— Que idiota que eu sou, meu Deus!
— Eu que o diga! Mas não foi por falta de aviso de minha mãe. Ela me alertou que você não prestava. Então, meu filho, permanece a máxima de o pau que nasce torto morre torto. Não seria diferente, né?
Depois de meia hora de um bate-boca interminável, ela está pronta e continua a soltar impropérios no percurso até o carro. Ele, sentado —ajusta o banco, clica no chaveiro que liga o veículo —, permanece mudo, circunspecto, e apenas a encara com ar de repulsa quando ouve o barulho forte da porta do veículo ao fechar. “Com certeza quer minha atenção”, pensou. Não expressou reação alguma. Logo ele que não deixa algo semelhante barato.
— Não estava apressado? Então vamos! Vamos logo antes que eu me arrependa.
— É esse o pagamento por tratá-la bem há dezoito anos, de quem só tenta agradar, ter respeito e ser carinhoso. Pelo menos eu tento, falta-lhe reconhecer algo tão simples. Quantas e quantas vezes sou tratado feito um animal? Não mereço. E não sei onde eu estava com a cabeça quando tive essa ideia de casamento em igreja a essa altura do campeonato. Já éramos casados no papel passado mesmo?! Para o seu governo, quem está arrependido sou eu, senhora!
— Como é? Então quer dizer que o senhor se arrependeu? Do casamento no religioso ou do tempo em que vivemos juntos? Dê meia-volta nessa droga de carro, quero voltar para minha casa, e vamos cancelar essa porcaria de igreja e o escambau. Não quero continuar como um estrupício. Aliás, o estrupício é você, que sabe escolher muito bem as ocasiões para ser desprezível. Nossos filhos terão uma boa explicação sobre isso tudo pela boca do belo pai que eles têm. Ah, se vão! Só sabe conversar lorota, porra!
— Não. Não voltaremos. Vamos direto a um cartório acabar com essa farsa, essa perda de tempo sem fim.
—Ah, é?! Não significo mais nada, seu filho da puta!
A riqueza do vocabulário dela de desqualificação é imensa e dura até chegarem ao Cartório da 5ª Avenida. Mas, infelizmente, ela terá de continuar a ladainha, pois, ao que parece, logo hoje todos os casais resolveram se separar.
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