Foto e Texto: Alex Gurgel
Para aqueles bravos, com espírito aventureiro, sabedor que o litoral não é a única porção de beleza em terras potiguares, a região do Seridó oferece um roteiro alternativo, cheio de histórias e lendas de um sertão multicor.
Adentrando a BR 226, o verde, florado pelas últimas chuvas, enche os olhos e faz esquecer a temível seca que assola o interior do Estado de tempos em tempos. Em Currais Novos, o sítio Totoró pode deslumbrar olhares ávidos pela história do seridoense e do município. De acordo com o historiador Joabel Rodrigues de Souza, o Coronel Cripriano Lopes Galvão migrou com sua família para fixar moradia e fundou a fazenda de gados Totoró – a qual era chamado “Currais Velhos” – após a guerra dos Bárbaros (1683 – 1713), quando houve a dizimação da população indígena dos Cariris.
O sítio Totoró é terra de lendas e folclore. História sobre o homem do campo e suas riquezas culturais são fáceis de se ouvir. Lugar misterioso e encantador. Dizem o mais antigos que o sítio ainda guarda tesouros arqueológicos na Lagoa do Santo, onde foram achados fósseis de mamíferos que habitaram a região na Era Pleistocênica (de 7 a 18 milhões de anos atrás). Na gruta da Pedra Furada, escrituras rupestres de tradição Nordeste, com aproximadamente dez mil anos, podem ser observadas. Com sua formação geológica semelhante a um caju, a Pedra do Caju é uma atração inconfundível da região.
Uma parada na Mina Brejuí, distante três quilômetros de Currais Novos, o visitante pode conhecer detalhes das riquezas minerais exploradas na região. Com a descoberta da potencialidade mineralógica identificada no município, com destaque para a Scheelita, na década de 40, quando se registrou o crescimento econômico local e regional, Currais Novos foi considerada como a cidade mais promissora e elitista do Estado. A produção da Scheelita chegou a representar 90% da produção nacional até meados dos anos 80.
Atualmente, a Mina Brejuí abre suas portas para receber o turismo de conhecimento, explorando a geografia da região e a história de suas riquezas minerais. Para recepcionar as pessoas, há sempre um guia entusiasmado, mostrando a vida de Tomaz Salustino, através de um Memorial sobre o visionário que criou a mina. Túneis, galerias, usinas e grutas são visitados, explorando o contato com a mineração até o subsolo. A Mina Brejuí ainda oferece um “banho de energização”, nas Dunas de Minérios, encravada em plena mata da caatinga seridoense. A apresentação da tradição folclórica de um grupo de Pastoril, no pátio da Capela da mina, completa o passeio em Currais Novos.
De sertão a dentro, o visitante se depara com a bela cidade de Caicó, terra de Sant’ana, a capital do Seridó. Lugar marcado pela fé, onde floresceu um povoado sob a prece de um vaqueiro. Conta a “Lenda do Vaqueiro” que havia um Boi Mandigueiro, muito bravo, nas terras de Manoel de Souza Forte. Certo dia, um vaqueiro penetrando nessas terras, viu-se, de repente, atacado pelo touro encantado. O vaqueiro fez o voto à Nossa Senhora de Sant’ana de construir ali uma capela. O ano era seco e o único vestígio d’água existente era a de um poço do rio Seridó. O vaqueiro renovou o voto a Sant’ana para o poço não secar antes da construção da capela. A Matriz de Sant’ana foi erguida e o poço nunca mais secou. “Se valendo da soberana, a virgem santa, foi no Poço de Sant’ana que nasceu meu Cació”, declamou em versos o poeta e artista plástico Custódio Medeiros, justificando a lenda da origem de Caicó.
Caicó já recebeu vários nomes como: Ribeira do Seridó, Vila do Príncipe e Queicuó. O topônimo teve seu primeiro registro documental em 1731, pelo capitão Inácio Gomes da Câmara, no sítio chamado Riacho do Seridó. De acordo com o historiador Câmara Cascudo, a origem do nome Caicó se encontra entre os índios e, dentre as várias versões existentes, a mais aceitável é a que defende sua gênese a partir dos termos Acauã e Cuó, que servem à designação de acidentes geográficos (rio e serra, respectivamente) da região. Acauã pertence ao idioma tupi, enquanto Cuó, à língua dos Tapuias e Tarairiús. Esses indígenas identificavam ainda o rio pelo nome de “quei”, o que sugere que Caicó seja uma corruptela de “Queicuó”, o mesmo que rio do Cuó.
Passeando pelas ruas da cidade, o visitante descobre vários casarios, com sua arquitetura do século XVIII ainda preservada e bem cuidada pelos moradores. Em um desses sobrados, está instalado o Museu do Seridó, onde o turista tem a oportunidade de conhecer as relíquias dos antepassados caicoenses, bem como sua cultura e tradições.
Localizado na periferia da cidade, o Castelo de Engady foi construído pelo pároco da cidade, monsenhor Antenor Salvino, em 1974. Para deslumbrar o visitante – o qual faz um passeio através do tempo e da história – o Engady tem sua arquitetura em estilo mouro-medieval, abrigando detalhes de castelos europeus do século XV.
Numa manhã de sábado em Caicó, o turista poderá fazer contato com o povo do lugar para sentir a gentileza e a hospitalidade das pessoas. Na tradicional feira livre ou no antigo Mercado Público Municipal; na Praça da Liberdade ou no Bar de Ferreirinha (conhecido reduto etílico, político e cultural da cidade), o povo caicoense está sempre celebrando sua fé e sua cultura sertaneja.
A região do Seridó já chamava atenção desde o início do século XX, quando era visitado por celebridades nacionais. Viajando pelo Rio Grande do Norte em 1927, o escritor e folclorista paulista Mário de Andrade, admirado com a arquitetura colonial de Jardim do Seridó, escreveu em seu livro Aprendiz de Turista: “Às 9 cortamos Jardim de Seridó, uma cidadezinha de Tarsila, toda colorida limpa e reta. Catita por demais, lembrando Araraquara por isso. Cidade pra inglês ver. Mas não tem dúvida que é um dos momentos de cor mais lindos que já tive neste aprendizado pra turista”.
A próxima parada é Carnaúba dos Dantas, lugar mágico, onde o Monte do Galo é a máxima expressão religiosa, recebendo gente em romarias, cujas bênçãos de Nossa Senhora das Vitórias, enche de fé o sertanejo. De cima do Monte do Galo, o visitante tem uma vista deslumbrante da cidade e do castelo Di Bivar, com sua arquitetura medieval francesa, estilo arredondado e suas torres nos lembram as torres de um jogo de xadrez.
De Carnaúba dos Dantas, o visitante segue para Acari, que ostenta o título de ser a cidade mais limpa do Brasil. Acari é nome de um peixe de escamas ásperas, com sua carne branca e saborosa, acostumado com as águas tranqüilas do histórico rio Acauã. Da boca do povo, nasceu o nome do povoado a partir da pesca fácil e permanente dos acaris.
Nos arredores da cidade, inúmeras paisagens proporcionam a prática do ecoturismo. O Açude Gargalheiras é um marco na história e na vida de Acari, com seus 40 milhões de metros cúbicos d’água. Está situado na bacia do rio Acauã, a cinco quilômetros da cidade, oferecendo um espetáculo natural de rara beleza rústica, entre rochas e serras. Em volta do açude, trilhas ecológicas surgem a cada passo, revelando inscrições rupestres, de tradição Nordeste e datada de dez mil anos, como na Pedra do Artur.
De volta à Natal, as lembranças das cores do sertão do Seridó purificam mentes e emocionam nossos olhos. Quem visita o Seridó, leva um pouco desse jeito sertanejo entranhado n’alma, garantindo seu retorno em busca de purificação.
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