Tá no Michaelis: oficial às ordens de outro de patente mais elevada, ou de um ministro, ou de chefe de estado.
O ajudante de ordens do presidente da república o acompanha em toda a sua agenda oficial, em reuniões reservadas e no automóvel presidencial. Ele tem acesso a informações pessoais sensíveis, tipo: telefone celular, correspondências oficiais ou não e às bagagens pessoais do chefe do Executivo.
O militar Mauro César Barbosa Cid, oriundo da Academia Militar das Agulhas Negras assumiu esse cargo em janeiro de 2019 e no período em que esteve à serviço de Jair Bolsonaro deu um salto na carreira, passando de major a tenente-coronel.
Na função de ajudante de ordens, atuou como o braço direito do presidente, convertendo-se no personagem de maior ascendência dentro do séquito bolsonarista, inclusive para assuntos de caráter pessoal.
Com livre acesso ao gabinete presidencial, ao Palácio do Alvorada e até mesmo ao quarto ocupado pelo chefe nos hospitais após as inúmeras cirurgias de desobstruimentos intestinais, a atuação de Cid foi ganhando visibilidade junto à mídia a partir da confirmação do seu envolvimento em vários e variados conchavos palacianos.
Foi Mauro Cid quem coordenou a tentativa de recuperar as joias que foram presenteadas a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro pelo governo da Arábia Saudita e que foram apreendidas pela Receita Federal no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. No cumprimento das ordens presidenciais, Cid assinou e enviou à Receita um ofício informando que um auxiliar do presidente iria até São Paulo para reavê-las, e, planejando agilizar a coisa toda, intercedeu junto à FAB e solicitou com urgência urgentíssima um avião e diárias para a ida do sargento Jairo Moreira da Silva a São Paulo, a fim de cumprir a espinhosa missão.
As “joias da princesa”, ops, da então primeira-dama, foram inicialmente avaliadas em R$ 16,5 milhões. Porém, após nova avaliação da Polícia Federal esse valor caiu para R$ 5,6 milhões. Se valem R$ 5,6 milhões ou três vezes mais, não vem ao caso. O Tribunal de Contas da União (TCU) não considera pedras preciosas e joias como bens de “natureza personalíssima” ou de “consumo imediato”. Daí o imbróglio diplomático/alfandegário: as joias sauditas não poderiam ir parar nos cofres bolsonaristas. Esse episódio ocorrido ao apagar das luzes do desgoverno bolsonaro, segue sob investigação da PF.
O ex-ajudante de ordens também é investigado, por ter supostamente operado um “caixa paralelo” no Palácio do Planalto por meio de saques nos cartões corporativos da presidência. A investigação sobre um esquema de desvio de recursos e “rachadinha”, identificou depósitos em espécie feitos para Michelle pelo poderoso “El Cid”.
A polícia ainda investiga se é de sua responsabilidade a produção do material usado por Bolsonaro em uma live em outubro de 2021, onde ele associa falsamente a vacina contra a covid-19 ao vírus HIV.
A atuação e prestígio do multifacetado Mauro Cid durante o governo bolsofascista foi tão marcante que chegou a “invadir” o governo Lula, quando se transformou no pivô da demissão do comandante do Exército, general Júlio César de Arruda no dia 20 de janeiro. O general foi demitido por não acatar a ordem do presidente Lula de revogar a efetivação do tenente-coronel bolsonarista, para chefiar o 1º Batalhão de Ações de Comandos, em Goiânia. Ao receber a recomendação por intermédio do ministro da Defesa José Múcio, Arruda disparou: “Ninguém mexe com ele aqui”. É o fraco!
Eis que, o mês de maio começa com a prisão preventiva do indefectível ex-ajudante de ordens, por suspeita de participação em um esquema de adulteração de dados nos sistemas do Ministério da Saúde, para fraudar comprovantes de vacinação contra a covid-19.
Na busca e apreensão na residência do dito cujo, a Polícia Federal encontrou 35 mil dólares e 16 mil reais em espécie. Agora Mauro Cid também está sendo investigado por lavagem de dinheiro. A polícia segue os rastros da bufunfa e uma conta no exterior já foi localizada.
O esquema de adulteração de dados do Ministério da Saúde forjou certificados de vacinação de Jair Bolsonaro e de sua filha Laura Bolsonaro, de Mauro Cid e sua família, e de mais uma “reca” de ex-subalternos que acompanharam o ex-presidente nas suas prolongadas férias nos Estados Unidos.
Logo após a prisão, o então advogado de Cid, Rodrigo Roca garantiu que não haveria delação premiada: “Não há o que ser delatado. Não há algo que esteja sendo escondido que possa servir como moeda de troca. Eu não defendo delator”.
Roca é um nome próximo à família Bolsonaro. Ele foi advogado do senador Flávio Bolsonaro no caso das “rachadinhas” e em 2022 foi indicado pelo ex-presidente ao cargo de Secretário Nacional do Consumidor.
Pois bem. No dia 10/05 Mauro Cid mudou a sua equipe de defesa e trocou de advogado. Assumiu a sua defesa, o criminalista Bernardo Fenelon, especialista em crimes do colarinho branco e em… delação premiada.
Em depoimento à PF em 16/05, Bolsonaro repetiu que não sabia de qualquer esquema para falsificar seu certificado de vacinação e que se o seu ex-ajudante de ordens arquitetou tudo, foi “à revelia e sem o seu conhecimento”.
No dia 18 foi a vez de Cid depor na Polícia Federal e ele decidiu ficar em silêncio. No dia seguinte, Gabriela Cid confirmou em depoimento à polícia, que havia utilizado cartão de vacinação falsificado e que a responsabilidade pela fraude foi do seu marido, Mauro Cid. O furdunço está formado.
Se no depoimento sobre a falsificação dos certificados de vacinação, Cid optou pelo silêncio, no do dia 22/05 sobre o caso das joias da ex-primeira-dama, ele respondeu a todas as perguntas feitas pela Polícia Federal. No entanto, até o presente instante não há informações sobre suas declarações no decorrer do interrogatório.
No bojo da investigação sobre o envolvimento de Mauro Cid em transações financeiras com a ex-primeira-dama, a PF conseguiu identificar como eram feitos os pedidos para saques e repasses de dinheiro para Michelle. Em uma das mensagens de Giselle Carneiro (assessora de Madame Bolsonaro) para Cid, ela diz: “A dama pediu saques”. As petições sempre vinham acompanhadas com uma súplica por urgência:
Giselle: “Cel a dama pediu 3.200 na conta dela o senhor consegue ainda hoje?”
Cid: “consigo”
Giselle: “Ufa! Obrigada”.
Em outra oportunidade:
Giselle: “Cel Conseguimos saque para hoje para a Dama?”, “Valor de 4.900 reais para transferir para a conta da Dama. Por favor coronel”
Cid: “Putz…”
Dizem as más línguas, que o tenente-coronel ficou conhecido nos intramuros palacianos como o “caixa-rápido da primeira-dama”.
O advogado de Jair e Michelle Bolsonaro, Fábio Wajngarten afirma que os saques e repasses não foram feitos com dinheiro público: “A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro reitera que todos os pagamentos e custos de sua família de pequenos gastos/fornecedores informais tinham como origem recursos próprios”.
E agora? Será que dessa vez Cidão vai permanecer calado ou vai escancarar a origem do dinheiro empregado nas retiradas da ex-primeira-dama?
Aguardemos os próximos capítulos. E como diz um amigo meu: “eu num diguénada”.
PS: Esse texto foi finalizado em 26/05 e, portanto, está sujeito a atualizações. Sabe-se lá o que o super, mega, hiper, ultra, extra, big ex-ajudante de ordens vai aprontar até o fim de maio, ou se não virá à tona mais uma de suas peripécias bolsonarianas?!