Dona Zefinha passou a mão no bolso do vestido à procura do celular. Quer falar com o marido, seu Jerônimo, pois lembrou-se de não ter recomendado a compra de “Coca-Cola pros meninos”, já que ele foi ao mercadinho em busca da mistura do almoço. É bom agradar a família quando esta se reúne aqui em Tibau.
Meninos correm pela casa, tem gritaria na piscina de plástico; barulho ensurdecedor da bola de futebol batendo no muro; crianças endiabradas por todos os cantos da casa, e ainda muita gente dormindo, apesar de já passar das 10 horas. Só o Antenor, genro da dona Zefinha, que tem o hábito de acordar cedinho, está sentado em uma cadeira de balanço pondo à mostra a enorme pança branca, na barraquinha montada embaixo do pé de caju, enquanto prepara uma caipirinha. Vai ‘iniciar os trabalhos’.
O assunto de hoje é sobre a noite passada, da incapacidade da polícia em mandar baixar um som do paredão. Nem os homens da lei conseguiram resolver uma briga no bar da esquina, quando todos queriam tocar tudo, no maior volume, querendo que o mundo inteiro ouvisse seus repertórios. Uma competição que gerou até bofetes, disseram.
— Ainda estou com a porra da música entranhada na cabeça. Essa porcaria não sai, diz Antenor.
— Já imaginaram como não temos nenhuma chance de acabar com esse descalabro nas noites daqui? — retrucou a mulher de Antenor, Marize, enquanto segura o filho na borda da piscina.
Eles comentaram que, ao final das discussões acaloradas no bar, o grande campeão da noite foi o Rei da Cacimbinha, que agitou o intelecto dos espectadores, com um “taco, taco e não pega”, até o sol raiar.
Dona Zefinha encosta à mesa e coloca um prato com alguns crustáceos como tira-gosto. Mas não quer entrar na conversa dos dois, pois acha que já tem muito a fazer e não quer polemizar. “Mas como é que alguém gosta daquele tipo de música, meu Deus?” — pensou. Mas não se conteve:
— Ora, se até o coronel Josué foi lá tomar satisfações do som alto e quase foi linchado pelos adoradores da Cacimbinha e dessas ruindades sonoras…
E continua:
— Desmoralizaram seu Josué. Já pensasse? Aliás, não só ele, desmoralizam, dia após dia, a segurança do Rio Grande do Norte no quesito “paredão”.
Neste momento, antes dela concluir o raciocínio, seu Jerônimo chega trazendo consigo uma palha de tainha e uma sacola com verduras em uma das mãos enquanto balança uma peixeira na outra:
— Os pimbas-moles de Tibau não usam máscaras. Mas não podemos generalizar. Considerando que os pimbinhas também não usam. É um verdadeiro baile de pimbas-moles.
Ninguém consegue conter o riso. A gargalhada é geral. Depois, a explicação que o assunto não era aquele.