Alguém entre os meus poucos leitores seria capaz de explicar porque a música Casinha Branca do compositor norte-rio-grandense Gilson, nascido em Macau, ficou tão famosa, sendo gravada até por Maria Bethânia?
Os inocentes poderão responder que se trata de uma música simples e muito bonita, capaz de sensibilizar gregos e troianos. Nada disso. Há milhares de canções tão bonitas ou até melhores que Casinha Branca que são gravadas todos os dias e que nunca chegam ao conhecimento do grande público, imaginem de Maria Bethânia.
A resposta está no livro Teletema, um calhamaço de mais de 500 páginas, escrito por Guilherme Bryan e Vincent Villari, que explora a trilha sonora das novelas de 1964 a 1989. Casinha branca entrou na trilha sonora na novela Marrom Glacê, em 1979, foi a 22ª mais tocada do ano e nunca mais parou de tocar. Sim, porque o caminho mais curto para o sucesso no Brasil é entrar na trilha sonora de uma novela. A canção mais tocada no ano de 1979 foi O bêbado e a equilibrista, que dispensa apresentações.
Muitos artistas brasileiros, de Guilherme Arantes a Djavan, de Gonzaguinha a Maria Gadu, não seriam os mesmos sem as novelas.
Em 1974, o compositor cearense Ednardo gravou o excelente disco O Romance do Pavão Mysteriozo, mas não teria alcançado a fama se a música que dava título ao disco não fosse escolhida para ser o tema da novela Saramandaia, escrita por Dias Gomes.
Guilherme Arantes era um desconhecido compositor que havia gravado um lp de rock progressivo com o grupo Moto Perpétuo, quando lançou seu primeiro trabalho solo e teve a canção Meu mundo e nada mais incluída na trilha sonora da novela Anjo Mau, em 1976. A canção, romântica, simples e de belas harmonias, caiu no gosto do público e foi a segunda mais executada do ano, perdendo apenas para Juventude Transviada, de Luiz Melodia, que fazia parte da trilha de Pecado Capital. Meu mundo e nada mais foi ajudada pela participação repetida no Globo de Ouro, um musical que a rede Globo exibia mensalmente e divulgava especialmente as músicas das trilhas sonoras das novelas e as gravações de sua gravadora, a Som Livre.
Minha mulher me chama para ouvir Ribanceira, de Chico Chico. Realmente uma bela composição mas duvido que ela tomasse conhecimento da canção do filho de Cássia Eller se não estivesse tocando na novela Pantanal.
A verdade é que as novelas fazem bem à nossa música pois além de lançarem novos artistas, praticamente ressuscitam grandes composições como é o caso de Amor de Índio, parceria de Beto Guedes com Ronaldo Bastos, gravada pelo primeiro em 1978, agora interpretada por Gabriel Sater, filho de Almir Sater. Convém lembrar que a carreira de Almir foi catapultada pela participação na primeira versão da novela.
Arleno Farias foi outro norte-rio-grandense que teve música incluída em trilha sonora de novela. Sua composição Bicho do mato fez parte da trilha da novela Esperança, da TV Globo mas Arleno não conseguiu a projeção de Gilson. Talvez a extrema semelhança de seu estilo, voz e forma de interpretar com o paraibano Zé Ramalho tenha até confundido a cabeça de quem ouviu e Arleno permanece como um ilustre desconhecido.