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Conto: A maldade desnudada

Por Natália Chagas

A maldade é uma vivente andando nos entornos de todos impávida e imparcial. Não distingue cheiro, cor, tamanho, gênero ou espaço. Na terra, no céu e entre nossos corpos, ela atravessa. Silenciosamente. Ivanor e Euclides não sabiam disso. Nem mesmo conheciam a palavra, muito menos a ação. Brincavam tranquilos entre pássaros e flores do campo na ingenuidade de todo anjo do local. Subiam e desciam desde o inferno até o cume do céu se sentindo donos do mundo todo. Suas asas eram pequenas, já que eram anjos novos, mas a rapidez que se locomoviam era surpreendente a todos que os observavam.

Certo dia, Euclides viu lá do céu uma menina brincando no parque com seu irmãozinho. Ela era linda! A coisa mais bela que Euclides havia visto na vida. Cabelos cacheados que desciam até abaixo do ombro, uma pele morena dourada, olhos castanhos amendoados, lábios grossos e sorriso largo e livre. Imediatamente, largou sua brincadeira com Ivanor e desceu para verificar aquela maravilha em forma de criança. Ficou encantando! Passou horas a fitá-la para, quem sabe, ela também o ver. Ivanor desceu atrás e tentava persuadir, insistentemente, o amigo a voltar à bricandeira. Em vão. Euclides não se interessava mais pelas traquinagens em que a dupla antes era cúmplice. Ivanor insistiu, e Euclides não dava ouvidos.

Ivanor subiu e observava de longe seu amigo arrebatado por um sentimento impossível. Ambos não percebiam, por causa da pouca idade, mas estavam sendo dominados por sentimentos. Anjos mais velhos haviam avisado e tentado ensinar aos mais novos a arte da imparcialidade do amor. Mas em inúmeros casos, a experiência é a melhor professora, então há de se esperar sua hora para cada um.

Entre amores e invejas, a maldade anda mais rápido.

Então Ivanor teve uma ideia de que se houvesse um estouro perto de Euclides, talvez assim, ele pudesse despertar desse encanto.

Cochichou no ouvido do segurança do parquinho para que ele verificasse a arma que carregava. O segurança pensando ser melhor estar sempre preparado, tirou o revólver da cintura para verificação. Olhou de um lado do calibre, do outro, e sentiu o tranco da arma atirando. BAM! Olhou para um lado para o outro dentro do parque e nem pôde perceber a maldade levando a bala diretamente ao coração do irmãozinho que estava no carrinho. A menina, ensanguentada pelo estouro em seu irmão, vive até hoje sem amor no coração, e carrega junto consigo seu anjo da guarda, Euclides, desolado por remorso.

Assim os anjos se descobrem humanos.

Abril é o monster!

A MÚSICA DO UBER