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O dia em que eu conheci Maria Luiza

Semana passada, por questões de trabalho, estive na Escola Municipal Hermenegildo Bezerra de Oliveira, na comunidade de Palheiros, zona rural de Assú/RN. Naquele dia, saí de casa apressada e, por essa razão, levei dentro de minha bolsa uma tangerina para fazer um lanche, porque sabia que essa visita, provavelmente, demoraria bastante.

Como esperado, enfrentamos uma manhã de muito trabalho. Em determinado momento, contudo, as reuniões não exigiam mais a minha presença, motivo pelo qual resolvi sentar no pátio da escola para comer a dita tangerina.

Provavelmente já havia se encerrado o intervalo e apenas uma turma brincava no pátio da Escola. Sentei numa mesa daquelas típicas de refeitório, que tem um banco largo e comprido atrelado a ela. Coloquei a tangerina sobre a mesa e comecei a observar o ambiente, mas sem ainda sentir necessidade de começar a comer.

Foi quando, ofegante, apareceu uma menina serelepe, e começou a conversar:

– Oi, como é seu nome?
– Oi, meu nome é Clarisse. E o seu?
– Maria Luiza.
– Você tá fazendo o que aqui?
– Vim com uma equipe de trabalho resolver umas coisas.
– Ah, sim! E você faz o que?
– Eu sou advogada.

A partir daí, confesso que o diálogo começou a me ser surpreendente, porque jamais imaginei que Maria Luiza fosse tão astuta:

– E é? E você já resolveu quantos casos?
– Vixe! Nem sei, mulher. Já foram tantos que não dá pra contar. Mas são muitos.
– Sim… tá certo. E você é advogada de quê?
– Tenho duas áreas de atuação, criminal e eleitoral.
– E você tem sua própria empresa de advogados ou trabalha pra uma empresa?
– Eu faço as duas coisas. Tenho meu próprio escritório, mas também sou contratada pela prefeitura de Assú. Aliás, é por isso que estou aqui.
– E você conhece Lula?

Refleti um pouco sobre a resposta para saber sobre quem ela realmente estava falando e continuei.

– Lula? Que Lula?
– O presidente, ora! Responde ela em tom de espanto por não crer que eu não sabia quem era Lula.

– Pessoalmente, não. Só pela televisão mesmo. Mas você sabia que em Assú também tem um Lula?
-E é? Mas ele é presidente?
– Não. Ele é dentista.
– Então, não quero conhecer ele não. Mas e o outro Lula, hein? O presidente. Ele não mora aqui no Brasil não, né? Por isso que você não conhece ele.
– Não, mulher, ele mora aqui no Brasil, sim. Mora em Brasília, que é a capital do Brasil.
– E é? Sabia não.
– Pois é.

Depois, ficamos em silêncio, até que a tangerina, ainda intacta, foi trazida ao cento da conversa pela pequena interlocutora.

 – Mulher, você sabia que tangerina é minha fruta preferida?
– Sabia não, mas, já que você disse, vamos comer essa aqui juntas.

E comecei a descascar a fruta para dividir com ela. Depois que lhe entreguei a metade, Maria Luiza saiu em busca de seus amigos, sem nem se despedir, mas feliz da vida com sua fruta preferida.

Sem intenção e sem saber, Maria Luiza me ensinou muito naquele dia.

Me ensinou sobre partilha, sobre inocência, sobre inteligência e principalmente sobre como podemos ser felizes com pequenos gestos e coisas.

Maria Luiza, que você cresça e nunca perca sua essência de ir em busca do que quer. Espero lhe encontrar no futuro e que eu ainda consiga enxergar em você o mesmo brilho no olhar daquela menina curiosa e inteligente, como a da última sexta-feira.

Escrito por Clarisse Tavares

CULPA | Capítulo XV

AMENIDADES BADULAQUIANAS