Por Clauder Arcanjo
— Seu Zequinha, a casa estava muito triste sem o senhor!
— Grato, querida Lídia. De coração.
— Agora, Lídia, o meu marido precisa descansar. Os médicos pediram repouso absoluto nos próximos cinco dias — completou Maria Djanira. Em seguida solicitou ao motorista Marquinhos que conduzisse o seu esposo na cadeira de rodas até o quarto de casal.
Lá chegando, antes de se deitar, Zequinha disse ao motorista que precisava se encontrar com a Creuza.
— E quanto à ordem de dona Maria? O senhor sabe…
Antes de concluir, o recém-chegado interrompeu-o:
— Só conseguirei repousar, acredite, depois de vê-la. Saia de forma discreta e traga-me Creuza. Sem falta!
Segurou forte no braço do Marquinhos, como se a demonstrar a importância daquela ordem.
— Está bem, mas repouse. Logo eu estarei de volta.
— E acompanhado!
— Sim, com a senhorita Creuza — declarou Marquinhos, para na sequência se retirar da residência pela porta dos fundos.
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A pequena casa se fazia iluminada por uma lâmpada incandescente, dependurada no centro do ambiente. Uma luz mortiça dava ao recinto um tom de tristeza, numa penumbra que gerava um quê fúnebre.
— Sabia que a encontraria aqui!
— Boa noite, seu Marquinhos. Não me diga que o senhor…
Marquinhos sentou-se em um dos tamboretes junto à mesa de centro, expondo a que veio:
— O homem, amiga, é forte. Resistiu à agressão covarde por parte daquele meganha. E, outra coisa: ele já está em casa e me pediu para levá-la até lá, sem perda de tempo.
Um riso largo enxugou as lágrimas de Creuza, e sua face ganhou um brilho incomum. Tal alegria trouxera iluminação para aquele casebre.
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Ao chegarem à casa, Marquinhos perguntou se não seria melhor evitar um encontro com dona Maria, guardiã do esposo que vira a morte de tão perto no leito do hospital.
— Não, seu Marquinhos, nesta residência, acredite, as coisas devem ser feitas com respeito e transparência.
Ao subirem os primeiros degraus, Marquinhos e Creuza foram recebidos por Lídia:
— A patroa me disse para não deixar ninguém incomodar, e eu cumprirei com as ordens dela.
Creuza baixou a face, entendendo os motivos da servidora. Marquinhos se antecipou e pediu que Lídia fosse até o quarto para avisar quem havia chegado.
— Isso vai sobrar para mim! Vocês não imaginam como dona Maria é zelosa.
Marquinhos pôs a mão direita sobre o ombro de Creuza e, de olhos postos em Lídia, sinalizou que estavam aguardando.
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Creuza entrou no quarto. Zequinha, de cabeça enfaixada, parecia dormir. Ela fez o sinal da cruz, agradecendo aos santos pela vida do amigo. Silenciosamente, virou-se para se retirar, quando ouviu:
— Que bom que você veio, minha querida!
Creuza, com a emoção até então represada, viu-se em choro convulso.
— Seu Zequinha, o que fizeram com o senhor? Culpa minha!
— Não, não. Aproxime-se e me dê um abraço.
Creuza ajoelhou-se junto à cabeceira, e beijou as mãos do amigo.
— Eu rezei tanto, tanto, que…
— Puxe uma cadeira; tenho pressa em lhe falar.
Creuza obedeceu. Mal ela sentou-se, ficaram a dialogar baixinho. Na verdade, Zequinha falava e Creuza ouvia atentamente.
Lá fora o passaredo inquieto nas copas dos benjamins da Praça do Poeta.