Um apelo desesperado de uma filha em busca de uma UTI para seu pai mobilizou as redes sociais no início de abril. Mais que socorrer o escritor e compositor Aldir Blanc, a hastag #AldirBlancSOS mostrou que a cultura e a classe artística brasileira também inspiravam cuidados urgentes.
Mesmo conseguindo um leito na Unidade de Tratamento Intensivo do Hospital Universitário Pedro Ernesto, na Vila Isabel, o médico, percussionista e amante da música e das letras não resistiu e faleceu no dia 4 de maio de 2020 aos 73 anos de idade.
O corpo, que não ficou lá estendido no chão, lembrou mais uma vez que já passava da hora do socorro aos trabalhadores da cultura. E, antes que cada um fosse pro seu lado, a deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) apresentou o projeto de lei (PL 1075/20) que destinou R$ 3 bilhões para ações emergenciais de ajuda ao setor cultural durante a pandemia da Covid-19. Chamado de Lei de Emergência Cultural, o texto foi aprovado pela Câmara Federal em 26 de maio.
O projeto de lei, com descrição de fontes de financiamento e prevendo a descentralização dos recursos a estados e municípios para fortalecer o Sistema Nacional de Cultura, foi aperfeiçoado com propostas de outros deputados que tramitaram apensados, sendo aprovado na forma do substitutivo. A relatora do projeto, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), sugeriu ainda que a lei fosse chamada de “Aldir Blanc”, homenagem ao artista vitimado pelo novo coronavírus.
Entre outros pontos, a proposta garantiu um auxílio emergencial de R$ 600 mensais aos trabalhadores do setor, subsídios a espaços artísticos e culturais, criação de linhas de crédito, e prorrogação de prazos para aplicação de recursos de projetos já aprovados pelo Executivo. Os recursos também estão sendo aplicados em instrumentos de incentivo à cultura, como editais, chamadas públicas e prêmios. O Governo do RN é responsável por aplicar o valor de R$ 32 milhões em recursos federais reservado ao Rio Grande do Norte através da Lei Aldir Blanc. Já os municípios potiguares receberam, juntos, mais de 22 milhões de reais.
Mas, enquanto o artista ficava sem público, com todos os eventos cancelados, os aguardados recursos ditos emergenciais não foram considerados urgentes pelo governo federal, que não se apressou nem um pouco em regulamentar a lei e fazer o necessário aporte financeiro para sua execução numa total incompatibilidade de gênios com os anseios populares. Para tocar a vida e pagar os boletos, muita gente se reinventou e a internet foi inundada de “lives”, entrevistas, cantos, danças e tudo e qualquer coisa que cumprisse a função da arte e aliviasse dias tão terríveis como os que tivemos este ano.
Sabe-se que a Lei, da forma que está regulamentada e pelo que exige de burocracia, não é perfeita. Sabe-se também que, infelizmente, não contemplará todos os trabalhadores da cultura. Mas, para quem se definia como “rigorosamente ateu, cético, cínico e escroto, nessa ordem”, é justo ele, Aldir Blanc, o nome que alimenta a esperança equilibrista deste país e mostra que o show tem, sim, que continuar.
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