Devo admitir que nunca fui bom em indicar séries. Minhas indicações são sempre ignoradas e/ou ironizadas nas conversas e debates familiares, entre amigos e grupos de whatsapp.
Em tempos idos, com o surgimento da TV por assinatura, assistíamos séries dos canais HBO, Sony, Warner, AXN, etc. O primeiro grande “hit” de que me lembro foi a série Lost, que só tive a curiosidade de assistir a um episódio, porque disseram que havia uma participação relâmpago e hilária de Rodrigo Santoro. Achei uma tremenda maldade com o ator brasileiro de carreira internacional. Sua participação não foi tão relâmpago e nem tão hilária assim. Acho até que ele se saiu bem. Lost passava no canal AXN. Nesse mesmo canal eu assistia e gostava de Alias, série de espionagem e aventura com a belíssima Jennifer Garner. No entanto, quando tentava falar alguma coisa sobre a série era imediatamente cortado: “uma chatice”. Na Warner, eu curtia as bobagens de The Big Bang Theory (bobagem + ciência) e Two and a Half Men, onde Charlie Sheen fazia o papel dele mesmo. Essas aí eu nem me arriscava a comentar, para não ser chamado de “abestado”. “Abestado”, de acordo com os “entendidos em série” é a pessoa que assiste séries de comédia. Nunca entendi o preconceito.
Então veio o mega sucesso e mega premiado Game of Thrones, da HBO. Meu filho conseguiu me convencer a assistir. Uma história estapafúrdia, com milhares de personagens, onde ninguém se entende ou consegue distinguir entre amigos e inimigos, parentes ou não parentes, cheia de mortes violentas, torturas inomináveis e… dragões. Desisti quando no último episódio de uma temporada, durante um casamento para selar a paz entre inimigos, todos os presentes na festa mataram-se uns aos outros. Morreu mais gente do que em todos os Rambos juntos e ainda 300 — A Ascensão do Império de lambuja. Nessa época eu assistia Mad Men, série sobre o mercado publicitário americano entre os anos 50 e início dos 70. “Como é que você assiste uma chatice dessas?!”, se espantavam os “entendidos”, para quem as únicas séries não chatas são as que eles assistem e indicam.
Cabe aqui esclarecer que: uma série (ex. Game of Thrones) tem como principal característica a continuidade, ou seja, existe um “gancho” entre um episódio finalizado e o próximo a ser exibido e essa narrativa sequenciada se estende por uma temporada ou até a temporada final. Já o seriado (ex. franquia CSI) é classificado como uma narrativa que pode ser concluída em apenas um episódio. As histórias são eventos que se resolvem rápido.
Dito isso, vamos encerrando por aqui esse interlóquio, porque são centenas de séries e seriados a serem comentados (clássicos como: Friends, as franquias CSI, Law & Order, Criminal Minds, séries sobre hospitais como Grey’s Anatomy, The Good Doctor, Chigago Med e outras tantas) e o tempo urge. Avancemos pois, até a chegada dos serviços de streaming no Brasil e a overdose de séries provocada pela Netflix a partir de 2011. À guisa de informação, streaming (transmissão) é a tecnologia de transmissão de dados pela internet, principalmente áudio e vídeo, sem a necessidade de baixar o conteúdo.
Aí o bicho pegou! Ficou impossível para uma pessoa normal — do tipo que mantém uma rotina diária de trabalho, estudos, lazer e que dorme e acorda nos horários recomendados pela ciência — acompanhar tantas séries e seriados disponíveis. Daí surgiu — assim acho eu — o termo “maratonar uma série”. Ou seja, passar horas, dias e noites, semanas e meses grudado em frente à TV até “os’ói ficar quadrado”, para assistir de uma cacetada só todas as temporadas de uma série famosa e super indicada.
Com o advento do estreaming, as indicações de “melhor série de todos os tempos” se multiplicaram de forma absurda. Até porque no rastro da Netflix, outros serviços passaram a operar por aqui: HBO Go, Globoplay, Amazon Prime, Apple TV. Ultimamente tenho recebido indicações de algumas séries dessas outras operadoras. Como acatar essas indicações, se não consigo dar conta nem de 1% do conteúdo da Netflix? Não é à toa, que de tanta coisa ruim que comecei a assistir e não terminei, o “pau que mais tem” — como a gente diz lá em Mossoró —, no meu histórico da Netflix é: “Continuar assistindo como Marco Túlio”.
E cada pessoa que indica, o dito “entendido em série”, defende a sua ou suas séries com unhas e dentes. E de nada adianta você contra-atacar com outra. Recebe logo o clássico: “uma chatice”.
Vamos em frente, porque em 2017, quando o serviço de streaming já estava plenamente consolidado no Brasil, o mundo conheceu e se apaixonou pela espanhola La Casa de Papel. Não parei para pesquisar, mas acho que foi a série da Netflix de maior repercussão, pelo menos até aquele momento. Série premiadíssima no mundo inteiro, sucesso de crítica e audiência incontestáveis. Por insistência dos “entendidos” resolvi encará-la, ainda que com um pé atrás. Trata-se de uma história completamente inverossímil e com um roteiro tão sem eira e nem beira, que ao invés de drama policial a série poderia ser classificada como realismo fantástico. Nada contra — que fique claro — esse gênero artístico/literário maravilhoso e que nos remete ao querido Ariano Suassuna. A verdade é que a muito custo consegui chegar ao fim da primeira temporada de La Casa de Papel, porém com interesse zero nas temporadas seguintes.
O que de pior essa série conseguiu deixar como legado foi transformar e popularizar “Bella Ciao” — uma clássica canção popular italiana, cuja melodia foi usada para a música de protesto que se tornou símbolo da Resistência Italiana contra o fascismo durante a Segunda Guerra Mundial — na “música de La Casa de Papel”. E pra completar a desgraça, “Bella Ciao” ainda ganhou uma versão brasileira através do funk de um tal MC MM, cujo significativo e poético título é “Só Quer Vrau”, e traz essas maravilhas de versos: “Essas malandra/Assanhadinha/Que só quer vrau, só quer vrau/Só quer vrau, vrau, vrau/Vem pra favela/Ficar doidinha/Então vem sentando aqui (Senta aqui, senta aqui, vai)”. Desgraça pouca é bobagem.
No entanto, sobrou algo de bom em ter visto La Casa de Papel: várias indicações para séries em línguas espanholas. Tá lá no histórico: “Porque você assistiu a La Casa de Papel”. Aí fui apresentado a: La Casa de Las Flores — comédia e drama (mexicana), Las Chicas del Cable — drama de época/anos 20 (espanhola), O Tempo Entre Costuras — drama de guerra (espanhola), Alto Mar — suspense de época/anos 40 (espanhola), Velvet — drama e comédia de época (espanhola). Excelentes séries, mas que não me arrisco a indicar a algum “entendido” pra não correr o risco de ouvir pela enésima vez, mais um: “uma chatice! Boa mesmo é…”.
Mas, se o caríssimo leitor e a caríssima leitora quiserem arriscar, fica a dica.
PS: Não quis citar os seriados que assistia quando criança logo que surgiu televisão em Mossoró (pelo menos na minha rua) no início dos anos 70 (Bonanza, Daniel Boone, Speed Racer, Túnel do Tempo, Perdidos no Espaço, Viagem ao Fundo do Mar e outros), porque esse artigo corre o risco de ter que ser publicado em série de tão longo.
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