Enquanto Espero
FRANCISCO COSTA
Enquanto espero, a vida passa
Numa torrente de sonhos infindos
Que jorram indolentes me fazendo pensar
Em cada momento pormenorizado e intimo.
Enquanto espero, a vida perpassa
O cadinho de todo o meu existir
Me ensinando que a vida ultrapassa
Cada desejo que trajo no ir e vir.
Enquanto espero, a vida se esgarça
No suave farfalhar da brisa em ação
Transformando cada amor que me embaça
Em delírios e sonhos que me inundam o coração.
ENCANTAMENTO
KALINA PAIVA
Meu pai era delegado,
ia sem capa enfrentar a criminalidade.
Minha mãe se dividia entre as salas de aula
dentro e fora de casa.
Meu irmão pequeno se aconchegava
em um bercinho modesto.
Eu sozinha menina entre pitombeiras
lia a história de Sherazade.
Ao meio-dia, no calor do Nordeste,
uma brisa trazia uma potiguara
para contar histórias com seu maracá na mão.
Ela levantava os braços,
chacoalhando as sementes
que dizia serem mágicas,
pois delas saíam
histórias de encantamento.
Assim, ela semeava narrativas
em nossos corações
de solo fértil:
uma a uma.
Sua voz reunia todos,
transformando a mesa do almoço
em um grande campo de flores
donde se avistavam matas e florestas.
Eu não sabia que a minha história
era mais bonita que a de Drummond
e tinha a força de mil e uma Sherazades
nas fontes da minha avó.
Hoje me deu saudade
DANIEL BEZERRA
Hoje me deu uma grande saudade,
Um sentimento que vem e invade,
Meu coração, lembrando o passado,
De momentos vividos e guardado.
Saudade do riso que ecoava no ar,
Das conversas até às altas horas,
Que aqueciam o coração a pulsar,
E das memórias que são tesouros.
A saudade dos olhares cúmplices,
De mãos entrelaçadas com doçura,
Das promessas sob o céu infinito,
Dos sonhos divididos com ternura.
Da canção que marcou a jornada,
E que embalou os dias especiais,
Que traz lembranças tão amadas,
Dos risos iluminando dias banais.
Hoje me deu saudade e a certeza,
De que o passado vive em mim,
Mesmo distante, o amor perdura,
Nas lembranças, em cada ternura.
REVERDECER
LÚCIA ENEIDA FERREIRA
Reverdeço-me com a primavera.
No pergaminho da minha face,
Traço, em cada ponto, meus anos dourados.
Não esmoreço,
Faço!
Nesta boca rasgada, dou voz aos meus sonhos.
Com estas mãos calejadas movimento o mundo.
Na prata dos meus cabelos retocados pelo tempo,
Vejo amadurecimento.
Dispo-me!
Revigoro na seiva ardente,
Pulsando o sangue do amor
Fecundo e infinito.
Vivo!
Veridiana Jácome *
Quem escutar o recado
dos astros no amanhecer
estará mais preparado
para o que tem de fazer
*5° lugar no Concurso de trovas de Nova Friburgo.
ESMERALDA – A CIGANA
ALBANIZA IVANOVICH
Cigana Esmeralda caminha na estrada
No lenço de seda presos os cabelos
Encasulando em sonho os pesadelos
Longo vestido de saia rodada
Os pés descalços seguem com graça
Pisando o chão e a grama fria
Pairando no rosto a nostalgia
A brisa morna o corpo abraça
Mulher, Maria, Esmeralda cigana
Carrega no bolso o baralho da sorte
Sustenta no peito faminta criança
A linha da vida no segredo da mão
A linha do amor na mão da cigana
No bolso o baralho e no peito a criança.
Eu sempre pensei que a felicidade seria fácil
BARROCA
Eu sempre pensei que a felicidade fácil seria
Que pelos esforços meus
m, eu iria . . .
m
m
é
é
é
Muito al
Mas, engano meu.
A vida me ensinou: Sem Amor Eu Nada Seria!
AUTOPOETIZAÇÃO AMOROSA
RADYR GONÇALVES
Há um milagre em deitar contigo aos pés da Lua…
Saber-te nua feito um livro bom aberto,
E ler-te cada seio, mãos e braços e baço e pernas e rins…
E poetizar mesmo os vãos impoetizáveis,
Voar com as aves, tocar os balões, cruzar os céus…
Gozar os gozos mais profundos e impublicáveis,
Romper os mares, rasgar os véus…
Há um fruto real de singular sabor, portanto, sacro,
Que revela-se ao suave toque da língua ávida,
Há em ti divina dádiva, que aflora, quando ouço-te,
E calo-me, e debruço-me e canto, e leio-te…
Poema de carne e osso em terreno etéreo…
Desejo lírico, beijo em flor, olor e mistério,
Amor que abre portas, fendas e janelas,
Que se autopoetiza e desbrava novos mundos.